terça-feira, agosto 11, 2009

Educação Básica no Brasil - Livro faz avaliação

Comentário Moisés Basílio:
Olha aí, mais um leva deeconomistas dando pitacos sobre educação. Segue também uma entrevista com o organizador do livro, o economista Fernando Veloso. Não tenho nada contra aos economistas estudarem educação e opinarem, mas o problema é que eles são arrogantes demais e querem ensinar o pai nosso ao vigário. Mas, não sejamos preconceituosos. Vamos ler o livro assim que for lançado. Axé!


Fonte: Jornal O Estado de S. Paulo - 10/8/09

"É preciso avaliar as escolas e cobrar''


Fernando Veloso: economista e doutor pela Universidade de Chicago; Organizador de livro sobre a educação básica no País, ele vê avanços na área e continuidade entre os governos FHC e Lula

Fernando Dantas, RIO

Um livro sobre educação básica escrito por economistas, com dados objetivos e análises científicas, traz uma notícia boa: assim como a economia deslanchou em 2004, dez anos depois do Plano Real, a qualidade da educação básica no Brasil pode estar no limiar de um gradual processo de melhora.

Quem resume essa mensagem é o economista Fernando Veloso, doutor pela Universidade de Chicago e principal organizador de Educação Básica no Brasil - Construindo o País do Futuro, coletânea de artigos assinados por uma impressionante equipe de acadêmicos - entre eles o Prêmio Nobel de Economia James Heckman. Por trás dos embates entre petistas e tucanos, Veloso enxerga uma linha de continuidade nos governos de Fernando Henrique e Lula, interrompida apenas brevemente no início do primeiro mandato do atual presidente.

Para Veloso, o Brasil construiu um arcabouço de avaliação do ensino básico, a partir de meados dos anos 90, que teve momentos decisivos com a criação da Prova Brasil - o exame para todos os alunos das escolas públicas ao fim da 4ª e 8ª séries - em 2005 e do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) em 2007. Ele vê na política educacional um tripé de responsabilização, competição e autonomia, que compara ao tripé de câmbio flutuante, metas de inflação e responsabilidade fiscal que deu a base para a continuidade da política econômica.

Os resultados devem aparecer lentamente, diz ele, em experiências como a concessão de prêmios para escolas bem-sucedidas em Estados como São Paulo e Pernambuco e no município do Rio. E esta é apenas uma de diversas maneiras de melhorar a qualidade da educação básica, o que se consegue apenas com um lento e difícil processo de tentativa e erro, que deve estar sempre escorado na avaliação e na cobrança de resultados.

Qual o objetivo do livro?

A educação é importante em várias dimensões - salário, crescimento econômico, participação política, para reduzir a criminalidade. E há um diagnóstico no Brasil de que a educação é ruim. Então a ideia é discutir o que se pode fazer para melhorar a educação básica, em particular a qualidade, mas olhando a experiência internacional e com base em dados empíricos. Daí surgiu a ideia central de que melhorar a educação é um processo. O livro não tem propostas simples, porque elas não existem.

Mas, então, de onde se parte?

É um processo, mas há elementos comuns nas experiências bem sucedidas. Elas utilizam diagnósticos baseados em dados; a partir daí, são elaboradas as políticas, com um papel central para a avaliação. Com avaliação, os erros são corrigidos. No fundo, é um aprendizado. E a avaliação é a forma de fazer esse aprendizado avançar.

O Brasil já trilha esse caminho?

Desde o governo Fernando Henrique há um processo para melhorar a educação. Várias políticas educacionais implementadas naquela época, como a ênfase na avaliação, tiveram continuidade, embora esse processo não tenha sido linear - no início do governo Lula, parecia que o enfoque no ensino básico seria perdido, com atenção maior ao ensino superior. O marco inicial da retomada foi a criação da Prova Brasil, com Tarso Genro como ministro. Mas foi na gestão de Fernando Haddad que se consolidou o sistema de avaliação. Foram várias ações, como a tentativa de substituir o vestibular com a utilização do Enem, ou a criação em 2007 do Ideb.

Qual a importância da Prova Brasil e do Ideb?

A Prova Brasil é um avanço, porque é um exame censitário. Em vez ser por amostra, ela é aplicada para todas as escolas públicas da 4ª e 8ª série. Essa mudança foi fundamental porque permitiu não apenas se fazer um diagnóstico geral, mas também avaliar cada escola pública. A importância desse passo é que todas as políticas bem sucedidas de melhoria da educação se baseiam na ideia de responsabilização. O Ideb combina os resultados da Prova Brasil com um índice de aprovação, que penaliza evasão e repetência.

Por que a responsabilização é tão crucial?

É preciso responsabilizar pais, professores e gestores pelos resultados dos alunos. Caso contrário, vira um jogo de empurra. É preciso atribuir responsabilidades para poder cobrar. Essa cobrança se tornou possível com a Prova Brasil e o Ideb, e tem suas origens no governo de Fernando Henrique, com medidas como a reformulação do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica). De forma análoga à política econômica, que envolve o tripé de metas de inflação, responsabilidade fiscal e câmbio flexível, na educação foi construído um arcabouço que permite avançar: um tripé composto por responsabilização, competição e autonomia, com a avaliação como um elemento central.

Qual o papel da autonomia e da competição?

A competição pode existir quando há uma medida de resultado no critério de distribuição de recursos para escolas. Pode ser o número de alunos ou a nota da escola na avaliação. A autonomia da escola é muito importante nas experiências internacionais bem sucedidas. É análoga à autonomia do Banco Central: a sociedade fixa os objetivos das escolas, mas a forma pela qual se atinge as metas deve ficar a cargo do gestor.

Por que assim é melhor?

Porque ninguém sabe melhor do que a própria escola quais são seus problemas. É preciso autonomia para que quem está na ponta seja capaz de identificar problemas e resolvê-los. Houve descentralização e municipalização, que aumentou o acesso à escola, mas não deu o resultado esperado em termos de melhora da qualidade. Porque não basta dar poder ao município - este poder de alguma forma tem de chegar à escola. A escola é muito amarrada: não pode demitir, tem dificuldade de contratar, tem muito pouca liberdade em termos curriculares, muitas vezes o diretor é indicado por razões políticas. Não se pode atribuir uma responsabilidade para a escola para melhorar o resultado sem dar os poderes para que ela efetivamente faça mudanças.

Como lidar com a questão do professor na melhora da educação?

É preciso ter um mecanismo para separar o bom professor do mau professor. O salário uniforme premia tanto o bom quanto o mau. E os critérios de promoção normalmente usados nas escolas, que são muito baseados em experiência ou formação, não são capazes de discriminar o bom do mau.

Todas as pesquisas internacionais mostram que simplesmente aumentar a experiência ou mesmo melhorar a formação do professor não melhora automaticamente o resultado. A relação com os resultados é muito frágil. A razão é simples: o bom professor é aquele que consegue motivar o aluno, cativá-lo para a transmissão conhecimento. Ele precisa de uma habilidade específica. A boa formação ajuda, mas é mais do que a boa formação. Todos estes sistemas que tentam premiar bons professores são uma forma de se lidar com isso. A demissão é outra forma, à qual sou favorável, mas que deve ser abordada com cuidado. A intenção não é simplesmente culpar o professor pelo resultado do aluno. Muitas vezes o resultado do aluno é ruim não tanto porque o professor é ruim, mas sim porque o aluno tem uma formação pior.

Quando vão aparecer os sinais de melhora na qualidade da educação?

Acho que plantamos as sementes. As iniciativas começam a ser tomadas, mas são todas muito recentes e vão levar algum tempo para amadurecer. Os Estados de São Paulo, Pernambuco, Minas e o município do Rio estão criando sistemas de avaliação onde são concedidos prêmios para as escolas em função dos resultados dos alunos. Infelizmente, como na política econômica, também na educação as grandes reformas demoram a dar resultado. O que sabemos no Brasil ainda é muito caso a caso. Sabemos de algumas escolas que deram certo, e outras que não, e conseguimos de certa forma saber que características têm as escolas que deram certo. Há escolas no interior do Nordeste, por exemplo, que melhoraram muito o desempenho educacional em circunstâncias socioeconômicas desfavoráveis. O que essas experiências já conseguem mostrar é um pouco o que o livro retrata: o que dá certo é mensurar o tempo todo os resultados dos alunos, e envolver continuamente os professores nesse processo de melhorar a qualidade, assim como a comunidade e os pais. O princípio é muito simples: é preciso cobrar.

Melhorar a educação depende de gastar mais dinheiro?

A experiência mostra claramente que simplesmente colocar dinheiro na escola não resolve. Porque o que é principal é ter os incentivos corretos. Se os professores da escola e o diretor não se preocupam com o resultado dos alunos, simplesmente jogar dinheiro na escola não vai melhorar o desempenho.

Isso não quer dizer que dinheiro não seja importante. Várias das experiências que funcionam envolvem recursos adicionais. O ponto é que o dinheiro tem de ser colocado nas intervenções que efetivamente funcionam. Se há intervenções que são mensuráveis, que estão dando resultados, acho que é inteiramente legítimo colocar mais recursos nelas. O que não funciona é colocar recursos indiscriminadamente nas escolas sem nenhuma preocupação com o resultado.

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