domingo, maio 27, 2012

BETO BRANT E O NOVO FILME "EU RECEBERIA AS PIORES NOTÍCIAS DE SEUS LINDOS LÁBIOS"


Comentários Moisés Basílio:
O Beto Brant é um diretor de cinema que precisa ser visto e revisto sempre. Nesse novo trabalho ele conta uma história de amor no contexto de nossos tempos atuais.
            Dois amores vivos e vibrantes da linda Lavínia. Um amor que nasce nas ruas degradadas de Copacabana, banhado por sexo, droga e a bíblia. E o Outro amor, sob os signos das imagens, que toma vida no interior do Pará nos encontros lúdicos e sensuais.
            Os conflitos políticos da grande Amazônia perpassa essa história de amor. Assim como na poesia épica da Grécia Antiga, onde a história de amor de Helena e Páris mobiliza a luta política das polís contra Tróia, a história de amor de Lavínia narrada por Brant faz emergir a exploração capitalista do território amazônico e seus desdobramentos em violência. 

Beto Brant em entrevista exclusiva para a Revista de CINEMA

Com sete longas em 15 anos e uma carreira consolidada, com prêmios e reconhecimento de seu cinema no Brasil e no exterior, Beto Brant agora está com todos os seus sentidos focados no lançamento de “Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios”, que estreou em abril, após levar vários prêmios, entre eles o de melhor filme no festival de Huelva e na Mostra São Paulo e de melhor atriz para Camila Pitanga nos festivais do Rio e do Amazonas. Desta vez, Beto Brant espera que seu filme alcance um público maior, especialmente em função do desempenho da atriz Camila Pitanga.
Rodado durante sete semanas nas cidades paraenses de Santarém e Itaituba, próximo a garimpos, e no Rio de Janeiro, Brant mantêm suas tradicionais parcerias: com Marçal Aquino, autor do livro homônimo como corroteirista, e Renato Ciasca como coprodutor, codiretor e corroteirista. Diretor de filmes politizados, Brant sonha brincando com esse filme bamburrar – termo muito usado no garimpo e que significa enriquecer inesperadamente. “Torcemos muito para esse filme bamburrar. Claro que o nosso bamburrar – sem aliança de grandes televisões, com um lançamento relativamente pequeno, já devendo dinheiro para o Fundo Setorial do Audiovisual e a pagar a cota de gastos do distribuidor – é ganhar um troco para aguentar um ano na produtora. Mas, acima de tudo, queremos ir para o público”, comenta.
Beto Brant despontou no cinema desde seu primeiro curta, feito como trabalho de conclusão do curso de cinema da FAAP, “Aurora” (1987). Seguiram-se “Dov’e Meneghetti?” (1989) e “Jó” (1993) antes de estrear em longas com o policial “Os Matadores”, em 1997. No ano seguinte, voltou com “Ação entre Amigos”, filme que será exibido e debatido, via projeto Cinema pela Verdade, do Instituto Cultura em Movimento (Icem), para discussão da Comissão da Verdade, em 81 universidades dos 27 estados brasileiros. Com “O Invasor” (2001), Brant alcançou grande sucesso de crítica e de público. Nos últimos anos, ainda dirigiu “Crime Delicado” (2005), “Cão sem Dono” (2007) e “O Amor Segundo B. Schianberg” (2010). Em entrevista para a Revista de CINEMA, realizada no escritório da Drama Filmes, sua produtora, na Vila Madalena, Beto Brant fala do seu novo longa, de suas parcerias, de seu processo de adaptação literária e de como é fazer cinema independente no Brasil.
Revista de CINEMA – “Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios” é mais uma adaptação literária que você faz. Por que esse gosto?
Beto Brant – Tenho uma história com o Marçal [Aquino] muito grande – já são vinte anos trabalhando juntos. E também já é meu o sétimo filme adaptado. É um jeito de ver coisas, de encontrar caminhos. Com a literatura, estabeleço diálogos, faço uma leitura cinematográfica do livro, não tento recriá-lo. Isso tudo é um ponto de partida para uma viagem que eu e o Renato [Ciasca] empreendemos. Saímos andando, procurando esses lugares e personagens. Acabo incorporando muito do que vemos no caminho. E por mais que façamos adaptações em relação à dramaturgia original, o espírito da história principal não muda, que é o relacionamento humano. Tanto que uma coisa rotineira era ver os atores lendo o livro, por mais que tivessem plena liberdade em recriar a cena.
Revista de CINEMA – Como é esse processo coletivo de criação e o que o levou a filmar esta história?
Beto Brant – O Marçal, desde que ficamos amigos, me mostra o que escreveu ou que está escrevendo. É uma forma de cultivarmos nossa amizade. Quando fomos fazer “O Invasor”, ele me mostrou os 30% que tinha escrito. Naquela energia juvenil, existia uma urgência de fazermos as coisas andarem e já quis começar a roteirizar o filme. E o Marçal, ao contar a história no roteiro, perdeu a vontade de contá-la no livro. Ele mesmo diz que é o primeiro leitor do livro, que precisa contar a história para ele mesmo. Dessa vez, eu até lia um episódio, um capítulo do “Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios”, mas disse a ele que só começaria a mexer no roteiro do filme quando o livro estivesse na editora. Demorou muito tempo para isso acontecer. Isso foi em 2005. Nesse momento, estávamos buscando financiamento de dois filmes, para fazer um dos dois, e emplacamos ambos, que eram o “Crime Delicado” e o “Cão sem Dono”. Isso adiou o projeto, ainda mais por ele ter uma necessidade orçamentária maior.
Revista de CINEMA – Como é a parceria do escritor Marçal na adaptação, como roteirista? 
Beto Brant – A minha relação com o Marçal não tem capricho, é promíscua mesma, não temos essa coisa de vaidade, o que é de um e o que é de outro. Claro, ele tem toda uma autoria literária, mas não reclama de mudanças no roteiro. Escrevemos juntos. Aliás, ele não escreve uma linha do roteiro – quem digita é ele – sem eu e o Renato estarmos ali juntos. Sentamos durante longas e demoradas tardes e noites criando cada cena juntos. E o bacana de três é que você tem que convencer dois. É um jogo muito legal. A cada novo roteiro, conseguimos parar para fazê-lo mesmo. Depois de um ano, voltamos para um novo tratamento, porque o projeto já está andando.
Revista de CINEMA – O livro tem um narrador muito forte e presente, que é o protagonista da história, o Cauby. Como foi o processo de extirpá-lo como narrador no filme?
Beto Brant – Não acho que tenha extirpado o narrador. O filme tem quatro capítulos. O primeiro é narrado pelo Cauby: a sintaxe do filme é toda acompanhando a trajetória do personagem. O segundo episódio, o do Rio, é narrado pelo pastor, como no livro, e volta para o Cauby. É narrado pelo personagem porque acompanha a trajetória do personagem; você não precisa, para ter a narrativa a favor dela, ter um narrador em off. O personagem do livro do Marçal é muito mais intelectualizado, cheio de referências literárias, tem muito a ver com o Marçal. O Cauby do livro já passou por toda a luta, destroçado pelos acontecimentos ele relata o percurso. O nosso Cauby é jovem, psicodélico, vai recebendo os acontecimentos e amadurecendo. Nosso Cauby é mais lúdico e mágico, oferece à Lavínia a brincadeira e isso a fascina. Em nenhum momento pergunta de onde ela veio – e esse passado traumático não fazer parte dela é o que ela quer. Ao mesmo tempo, está vinculada a esse outro cara, esse pastor, que é uma coisa meio teologia da libertação e meio daime – esse sincretismo religioso encoraja as pessoas ideologicamente. O Cauby tem que se explicar pela imagem; minha linguagem é o cinema. Então, tirei essa coisa meio intelectualizada e fui tentar mostrar o olhar do Cauby, o estímulo visual e auditivo.
Revista de CINEMA – Seu novo longa bebe na mesma fonte de seu filme anterior, “O Amor Segundo B. Schianberg”, que é o livro do Marçal. Como foram pensados os diferentes procedimentos de adaptação, não só de roteiro, mas também de estética?
Beto Brant – Nessa minha relação com o Marçal, de ele me abrir o processo de criação do livro, acabei lendo parciais de escritura do “Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios”, em que havia a trama do Professor Schianberg. À medida que o livro caminhou, o Marçal resolveu cortá-la bastante, pois era uma digressão e precisava se focar na história principal. Mas eu li aquela trama. Quando a TV Cultura me chamou para fazer o projeto Direções III, não quis fazer um filme para TV, quis fazer algo mais específico, brincar com a linguagem televisiva. Propus à TV Cultura fazer um reality show, um anti-Big Brother. Ao invés de uma caça de recompensa, o convívio entre dois artistas, durante três semanas, numa casa na Aclimação, onde ficamos com oito câmeras de vigilância. Os atores estavam livres para ir e vir, mas só capturávamos imagens ali. Eu não tinha convívio com eles, tudo era dirigido por mensagem de celular, email, telefonema. Captado com material de baixa resolução, que foi tratado depois, bancado pela TV Cultura, e com a possibilidade de fazer um corte para cinema. Lancei o longa pequeno. Se não tivesse ido beber naquela fonte quando ele estava escrevendo, talvez o filme não existisse, porque aquilo ficou na minha cabeça.
Revista de CINEMA – Há outras conexões entre ambos os trabalhos?
Beto Brant – O personagem do Gustavo Machado em “O Amor Segundo B. Schianberg” é o mesmo do fotógrafo de “Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios”. Naquela trama que o Marçal desenvolveu e que não ficou no livro, o Cauby é aquele cara de “B. Schianberg” antes de ir para a Amazônia, vítima de uma emboscada que um psicólogo experimental e sua filha atriz enredam, numa relação de observação do comportamento amoroso. Ao adaptar, tirei esse contexto e fiz uma videoartista e um ator. Nesse período, fiquei muito amigo do Gustavo Machado, porque ele se entregou muito ao projeto, àquele embate, àquela proposta, que tinha muita exposição. Quando fui fazer o “Eu Receberia…”, ele veio junto – por admiração ao trabalho dele e pelo nosso entrosamento.
Revista de CINEMA – A atuação de Camila Pitanga tem chamado muito a atenção pela total entrega ao papel. O que levou a escolhê-la para o papel de Lavínia e como foi o trabalho que fez com ela?
Beto Brant – Essa personagem, depois de cinco reimpressões do livro, já era um mito. Como dar conta disso? Que atriz escolher? Primeiro, fui andar pelo Pará. Andamos mais de 2 mil quilômetros procurando essa locação e o pessoal que mora ali. Convidei a Camila porque está no auge da carreira, da beleza e do talento. Senti que ela, não só pela filiação com o Antonio Pitanga, um importante ator do Cinema Novo, crescendo assim engajada, é muito comprometida ideologicamente, e sempre muito consequente e crítica de suas ações. Apesar de o filme ser essa paixão arrebatadora em primeiro plano, há questões ideológicas em volta do filme muito importantes. Tive a Camila como uma grande aliada nesse projeto. Quando conversei com ela pessoalmente – havia pedido que ela lesse primeiro o livro – e pelo caminho que ela entrou no livro, percebi que tinha jogo e que traria coisas que eu não sabia sobre Lavínia. Camila ficou no Pará durante o tempo da produção. Acho muito importante para a concentração do ator o convívio da equipe e no set. Ensaiamos as cenas, por exemplo, no horário em que acontecem. Se a cena acontece às 3h da manhã, ensaiamos nesse horário. Tem uma fisiologia do ator, o organismo dele funciona e percebe o mundo diferente. A percepção do ator vai trazer coisas importantes. E Camila se entregou a isso.
Revista de CINEMA – Você disse que sempre acaba incorporando coisas que vê no caminho. No caso do último filme, seria a questão do desmatamento da floresta no Pará?
Beto Brant – Por mais que sempre façamos adaptações ao livro, quando estávamos pesquisando, descobrimos um conflito forte de terra, em que as populações ribeirinhas estavam reivindicando duas questões: primeiro, com o IBAMA, contra o remanejo ilegal de madeiras que deveriam pertencer a eles; segundo, a demarcação de terras, pois querem ser admitidos como índios. Mais de setenta comunidades se reuniram e sequestraram duas balsas de madeira e tentaram negociar com o IBAMA, com a FUNAI, com o governo. Não tendo a negociação, uma dissidência botou fogo na madeira. Hoje as lideranças estão respondendo processo por conta desse ato ilegal. Estava no calor do momento quando fomos pesquisar. Começamos a filmar em junho de 2010, em março tinha acontecido isso. Por que vou então recriar o garimpo, que está no livro, mas está frio no lugar? Vamos nos envolver com isso, vamos mudar o pano de fundo para algo mais atual. Tentamos recriar um pouco disso. Logo que conhecemos aquela gente e conhecemos a causa, nos identificamos a ela e quisemos trabalhá-la. Só tivemos que conversar com o produtor, por uma série de questões que seriam adaptadas.
Revista de CINEMA – Mas você acaba se engajando nessas questões?
Beto Brant – Meu engajamento são os filmes de fato, mas sou solidário às comunidades. O filme acaba sendo uma aliança ao movimento deles. É o que o cinema que estamos fazendo oferece à sociedade – mas não é sua finalidade, a finalidade é provocar, encantar, fazer pensar, colocar o filme pro mundo pra quem quiser pegar.
Revista de CINEMA – Outra questão que parece muito presente em seus trabalhos é a identificação com o espaço, seja urbano, seja rural, seja confinado num espaço fechado. Por que trabalhar essa questão?
Beto Brant – Para mim, o cinema é um pretexto para sair passeando. Para fazer cinema, você precisa ter vontade de andar, precisa ter curiosidade. Esse caminhar é um reconhecimento de lugares, de códigos, de luzes; para mim é muito importante a recriação desses espaços dentro dessa dramaturgia.
Revista de CINEMA – Além do Marçal, você tem outro grande parceiro, o Renato Ciasca. Ele foi produtor de muitos filmes seus e agora é também codiretor incluindo “Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios”. Como surgiu a parceria e como funciona? Há divisão de trabalho?
Beto Brant – Ele está comigo desde a faculdade, codirigimos juntos meu primeiro curta, “Aurora” (1987), fez assistência de direção de “Os Matadores”, e, depois com o “Ação entre Amigos”, passou a participar dos roteiros. Em “O Invasor”, montamos nossa própria produtora, a Drama Filmes, e nesse e em “Crime Delicado”, ele foi efetivamente coprodutor. Como fizemos uma viagem para fazer “Cão sem Dono”, nos deslocamos, e agora no “Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios” fomos ao Pará e reconhecemos aqueles lugares juntos, quis chamá-lo pro set, não só para resolver questões de produção, mas para que estivéssemos trocando ideias, na amizade e na cumplicidade que nós temos, construindo os planos e as cenas. Claro, pelo meu histórico, tenho um trabalho maior com os atores. Às vezes, nós dois conversamos com os atores, mas na hora de rodar, centro a comunicação. Ele, experiente na produção, barra problemas eventuais. Faço questão de estarmos juntos discutindo o movimento de câmera e ver o que podemos melhorar. Eu, ele e o Marçal somos muito amigos, é promíscuo mesmo. Não tem briga por vaidades e veleidades.
Revista de CINEMA – O Marçal vai ao set?
Beto Brant – Gostaria que fosse mais. Ele sempre está envolvido em muitos projetos. É uma alegria quando vai. Em “Cão sem Dono”, por exemplo, quando fazia a pesquisa no Rio Grande do Sul, estava meio descontente com o final da história e trouxe o Marçal pra conversar, que me estimulou a buscar caminhos. Agora no Pará não pode ir, mas de vez em quando ligava pra ele pra discutir algo. Antes de rodar o filme, levei o Gero Camilo, que faz um personagem muito literário que é o Vitor Laurence, para a casa do Marçal e conhecer a biblioteca dele.
Revista de CINEMA – Nota-se em seu trabalho um gosto muito forte no retrato do marginalizado. Por que isso?
Beto Brant – Uma pessoa que está nesse grau de instabilidade tem conflitos; essa tensão desse movimento de se transformar é conflituoso e dramático. A pessoa que tem estabilidade, um status quo, tem uma dramaturgia do gesto delicado que não é muito minha praia. Gosto mesmo de quem está em processo de transformação, que tem essa instabilidade. Esses personagens marginalizados estão buscando caminhos e/ou reagindo a agressões muito fortes. Quando vou a festivais internacionais, sempre estou ligado aos filmes latinos, são os que quero ver, porque neles as pessoas suam, sangram, são intensos, se jogam, são passionais. Tenho um interesse por filmes que não se complicam demais intelectualmente, que se entregam à experiência de corpo.
Revista de CINEMA – É por conta disso que você vem tratando de paixões alucinadas? E por isso acabam, inclusive, ganhando um contorno meio violento?
Beto Brant – Essa é uma leitura que você faz e não me resta muito a não ser concordar. É. “Crime Delicado” tem uma delicadeza muito forte ali, mas é intenso. Uma mulher com uma perna amputada que não se sente inteira. Uma das coisas que mais tocou a Lilian [Taublib, atriz] quando fez o filme foi a carta de Antonio Martins que diz “aquele que te quer inteira”. Inteira é se sentir, sem uma perna, completa. Ela sai do filme se sentindo inteira. Ela não usa mais a prótese que usava. Hoje ela se sente bela. É delicado e não é, é um crime delicado. Meu filme é intelectualizado, mas é passional também.
Revista de CINEMA – Como filmar sexo e nudez no cinema brasileiro atual? Você acha que o Brasil desaprendeu a filmar tais cenas?
Beto Brant – Não posso falar pelos outros. Na minha cabeça, me sinto meio alienado, porque não sinto essa pressão. É lógico que depois pago o preço, porque tem festival que não chama, distribuidor que não se interessa. Dessa vez, não, vamos lançar, pela primeira vez, com mais de 50 cópias. É nossa maior estreia, a anterior tinha sido de “O Invasor”, com 14. Logicamente, muito por conta da Camila – que está muito bem, super engajada no filme, se entregou completamente. Não vejo como isso pode ser moralmente recriminado, se é uma experiência tão transformadora para a equipe, que passa a ser tão importante na carreira de todo mundo. Não me passa pela cabeça. Há uma tendência, um medo, de quando você pensa que a comunicação está na mão de grandes corporações, que estão compromissadas com questões políticas e com setores da sociedade muito moralistas. Hoje em dia, o governo até pode ser mais liberal, mas negociam com a ala mais careta e moralizante. Tudo vira um jogo muito esquisito e muito medroso, medo de ser rejeitado pelo mercado. Minha mentalidade é: vou fazer esse filme com uma liberdade total, é um acordo que tenho com toda a equipe que chamo. Vou fazer isso com integridade. Se for o último, paciência, mudo de profissão.
Revista de CINEMA – Fazer cinema independente é isso?
Beto Brant – É, independente porque é livre de pressões de mercado. Podíamos fazer um filme mais caretão e quem sabe abrir com mais cópias, vender para a Globo Filmes. Mas não quero isso. O filme da gente vive com a gente. Somos reconhecidos como as pessoas que fizeram o filme. Quero estar com a consciência limpa de que fiz o melhor, com total liberdade. Que seja transformador, que estejamos compreendendo algum assunto melhor. Claro, isso tem seu lado negativo. A cada filme, você começa de novo do zero, não consegue captar todo o orçamento, é mais difícil encontrar distribuidor. Depois de sete filmes, você tem algo a seu favor, mas é complicado. Ainda bem que temos o filme do Lírio [Ferreira, “Sangue Azul”, como produtores] pra fazer, o Renato [Ciasca] está em Recife agora pesquisando com ele.