terça-feira, julho 24, 2012

Nem uma lágrima: teatro épico em perspectiva dialética

Resenha
te superior do formulário
Parte inferior do formAutor: Iná Camargo Costa
Número de páginas: 155
Editora: Expressão Popular
Categoria: Crítica teatral
R$ 15,00

Por Moisés Basílio Leal

                Particularmente, ler essa coletânea de textos de crítica teatral me ajudou a sair do lugar comum do espectador. Deu-me argumentos para interagir com a arte teatral da qual sou amante. Muitas perguntas que intuitivamente me fazia sobre o teatro me foram respondidas lendo os textos da Iná Camargo Costa.
                    Li esse livro não como um especialista em teatro, mas como um espectador. Mas também como um espectador que toma partido na luta social e que traz as marcar da tradição das lutas sociais e politicas socialistas. E na minha militância política, a expressão teatral foi sempre um elemento importante.O nosso saudoso Augusto Boal disse certa vez que todos somos atores, mas será que todos também poderemos ter a condição de sermos críticos teatrais? Arriscarei, pois já se dizia no tempos paassado: "Quem não arrisca não petisca".
      Lembro-me ainda que minha primeira manifestação política pública, emancipação do ego, se deu numa peça teatral. O grupo de jovens que eu participava, na Paróquia N.S. do Pilar, encenou uma peça para encerrar o encontro de jovens da comunidade católica em que eu participava. Os encontros de jovens católicos lá pelos idos dos anos 70 eram muito fortes nos quesitos sentimentos afetivos e espirituais. O jovem ficava três dias em retiro, num ambiente onde a sociedade da paz e do amor cristão eram reinantes. Ao final do encontro os jovens assistiam a uma peça teatral. A peça que eu participei era de autoria do controvertido Neimar de Barros e se chamava “Deus Negro”, que além de texto de peça teatral foi um livro best-seller que vendeu milhões de exemplares nos anos 70.
    Lembrei-me desse episódio de minha adolescência ao ler o primeiro texto do livro intitulado “Teatro na luta de classes”. Nesse texto escrito para um seminário do grupo paulista Engenho Teatral, em 2009, Iná Costa nos mostra que o teatro é uma arte contextualizada com a dinâmica social do seu tempo. Embora a autora se posicione numa perspectiva da luta de classes para explicar os movimentos da dinâmica das artes cênicas, para mim mais do que a questão de classe, o que me abriu o horizonte foi a consciência da cor da pele, ou seja, a consciência da negritude, a consciência racial. Pode até soar sacrilégio, mais foi Neimar de Barros, com um "drama naturalista" da democracia racial, do que Karl Max com sua economia política europeia, que me fez compreender as contradições da sociedade em que eu vivia. E tudo isso via a linguagem teatral.
    O segundo texto intitulado “Transições” é o mais denso e rico da coletânea desse livro. Iná Costa vai detalhando a luta da classe trabalhadora para entrar na cena dramaturgia hegemonizada pela classe burguesa. Nesse texto é importante ver percurso que vários autores vão realizando para por em crise o drama moderno. Ibsen com “Casa de Bonecas”, questiona a sociedade patriarcal e põe em cena a figura feminina como agente histórico; Tchekhov que traz à cena novos atores sociais.  O Teatro livre e Naturalismo de Antoine e Hauptman, que traz para a cena teatral o movimento literário do século XIV europeu. Strindberg e sua busca para superar o naturalismo no drama. George Kaiser e Ernest Toller e o expressionismo no teatro. A importância do teatro no movimento político da II e da III Internacionais. E finalmente, Piscador e Brecht e as formas do teatro político.
  E nesse segundo texto mergulhei na minha experiência pessoal. Lá pelos idos dos fins dos anos 70 lendo os textos do livro "Teatro do Oprimido" do Boal e fazendo teatro no meu dia a dia e na luta social.  Teatro no supermercado, no ônibus, e no próprio Teatro. No final do ano de 1978, no Teatro Ruth Escobar, eu, a Jeane, a Lucirene e outro companheiros do grupo de jovens cantávamos, na fila de entrada do teatro, antes do peça "Revista do Henfil" uma paródia da clássica modinha de final de ano "Adeus ano velho":

"Adeus A-5,
Feliz ano novo,
Que haja Democracia
No ano que vai nascer
Muito respeito ao povo
De quem estiver no poder."

Também assistí no TAIB a peça "Murro em ponta de faca" dirigida pelo Boal, depois da Anistia. O teatro teve um papel fundamental na luta contra a ditadura militar no Brasil e também para democratizar as relações sociais. Um grande autor teatral que também fez minha cabeça na juventudo  foi o querido Plinio Marcos, que trouxe para o palco os "malditos sociais" em carne viva - operários, desempregados, prostitutas, bichas, ladrões, presidiários etc.
O terceiro texto se dedica ao trabalho de direção teatral.  Aqui Iná Costa faz um apanhado geral das trajetórias dos grandes Stanislavski e Brecht.  Texto instigante para quem quer ter um roteiro básico de pesquisa e leituras.
O quarto texto da coletânea é “Brecht e o teatro épico no Brasil”. É um texto básico para se compreender a presença de obra de Brecht em nossas terras Tupiniquins. Um retrato vivo e com riqueza de detalhes, de quem além de estudiosa analise, viveu também a chegada da dramaturgia Brecht em nossas bandas.   
Por fim, o texto “Brecht no cativeiro das forças produtivas”, de 2007, onde Iná Costa tece sua verve contra o odioso sistema capitalista e lança suas esperanças numa estética que construa as armar da revolução socialista.