sábado, abril 07, 2012

TORQUEMADA - 17 BALAS: O TEATRO DO OPRIMIDO COMO ESPAÇO DE REVIGORAMENTO DA MEMÓRIA E DA CIDADANIA ATIVA

Por Moisés Basílio Leal

Uma peça de teatro pode nos ajudar a refletir sobre a vida ou pode ser só um mero entretenimento.  Há quem defenda radicalmente um extremo ou outro e há também quem prefira o meio termo. Eu gosto de teatro bem feito, do teatro político na acepção etimológica grega da palavra política, aquele que nos impele às ações de refletir, transcender e transformar as nossas vidas e a vida da polis.
Como quase tudo na vida, sempre é preciso tomar partido, ter opinião, para não virar o famoso personagem “João Ninguém”, composição musical de Noel Rosa dos anos 30. A peça “Torquemada – 17 Balas” assume de que lado está desde a primeira cena, quando são projetadas a imagem e a fala do militante Carlão dando o seu depoimento sobre a tortura praticada sistematicamente nos porões da ditadura militar. Aliás, a própria peça é ambientada no porão do Teatro Coletivo. E mais, o coletivo que encena a peça trabalha com a dramaturgia do Teatro do Oprimido, e nesse espetáculo com a técnica do Teatro-Fórum, do saudoso Augusto Boal.  
Quando a fala do Carlão termina, segue-se a projeção de cenas da participação da seleção brasileira de futebol na Copa do Mundo de 1970, no México. Futebol é guerra. Guerra é a política feita com o uso da violência. Futebol, guerra, violência e os militares no poder. Eis o contexto fértil para a aceitação da tortura como instrumento para se apurar a verdade.  Como já cantou Chico: Num tempo página infeliz da nossa história, passagem desbotada na memória. Das nossas novas gerações”.
Mas, que verdade é possível se apurar com a tortura? O depoimento da Presidenta Dilma sobre verdades e mentiras diante da tortura é impactante. A verdade que emerge da tortura enfim serve para a mentira. Ou então serve, como aconteceu com a experiência de Augusto Boal, para fazer uma peça – fazer arte – que faz emergir um brado atemporal denunciando a tortura como mecanismo escuso tanto na inquisição católica, quanto nas ditaduras latino-americanas dos anos 60 e 70, ou nas quebradas da periferia de São Paulo do século XXI. 
E nos atos seguintes da peça, as memórias desbotadas das novas gerações, tendo como protagonistas os jovens esqueitistas, faz esse encontro do novo com a velha tradição da violência que atravessa os séculos desde a chegada dos colonizadores europeus em terras de Pindorama. Seja a violência das instituições privadas da sociedade, seja a violência do Estado português-brasileiro, que numa sociedade tradicional patrimonialista andam de mãos dadas e acabam sendo o real mediador dos conflitos sociais, econômicos e políticos.
Ao final o “curinga”, personagem mediador do conflito na metodologia do Teatro do Oprimido, aparece e convida o público para o fórum de debates a fim de buscar novas saídas e encenar outras possibilidades de resolução dos conflitos entre opressor e oprimido. Cabe ao público, interferir na realidade para transformá-la.  
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Fonte: Página do PROJETO TORQUEMADA – em 31/03/2012 - http://www.torquemada.art.br/?page_id=44


Peça “Torquemada – 17 Balas” discute opressão da ditadura aos dias de hoje baseada em texto de Augusto Boal
Montagem do GTO da Garoa e da ONG Mudança de Cena estreia no dia 31 de março no Teatro Coletivo com entrada grátis
No próximo sábado, dia 31, estreia em São Paulo a peça “Torquemada – 17 Balas”, releitura de um importante texto do dramaturgo Augusto Boal, escrito em 1971. O espetáculo tem pré-estreia para convidados no dia 27/3 e entra em cartaz no dia 31 de março, às 17h, no Teatro Coletivo. A entrada é gratuita.
A peça tem como foco o resgate das memórias de períodos de opressão. O enredo costura o passado e o presente, mostrando como o abuso nos dias de hoje nas periferias é um reflexo da impunidade do regime militar e um resquício de uma forma de pensamento presentes desde os tempos de Tomás de Torquemada, inquisidor espanhol. O espetáculo utiliza a técnica do Teatro Fórum, em que, ao final da apresentação, o público tem a oportunidade de discutir a temática e entrar em cena para transformar a realidade apresentada.
Após a estreiaem São Paulo, onde fica em cartaz até o dia 10 de abril, o espetáculo será encenado em Guarulhos, Taboão da Serra, Rio Claro, Campinas, Santos, São Bernardo do Campo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Vitória e Brasília.
A peça faz parte do projeto “Torquemada: Resgatando Memórias da Opressão do Passado ao Presente”, que também traz oficinas de Teatro Fórum e mobilização nas redes sociais.Em São Paulo, a oficina será realizada no dia 2 de abril, no Tusp.  Por meio de jogos teatrais, o encontro gera um espaço de reflexão sobre o papel das pessoas na sociedade na preservação da memória sobre o regime militar brasileiro, no combate à violência dos agentes do Estado nos dias atuais e na mobilização para transformação. As reflexões geradas pelas oficinas alimentarão os fóruns de discussão virtual e também nos estados em que o projeto circulará.
À frente das atividades estão Yara Toscano, coordenadora do projeto e gestora da ONGMudança de Cena, e Kelly di Bertolli, diretora do espetáculo.  Por 15 anos, elas trabalharam com Augusto Boal e levaram trabalhos com Teatro do Oprimido para diversas cidades dentro e fora do Brasil. O projeto é resultado de parceria entre o GTO da Garoa (Grupo de Teatro do Oprimido de São Paulo) e a ONGMudança de Cenae tem o financiamento da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça através do Projeto Marcas da Memória
Debates online
Para reforçar o conceito de diálogo do Teatro Fórum, as discussões encenadas durante a peça ganham continuidade por meio do site da peça www.torquemada.art.br. Lá, atores, políticos e movimentos sociais podem dar continuidade ao debate iniciado na apresentação e também realizar novas manifestações em prol da memória e da defesa dos direitos humanos.
Serviço
Torquemada – 17 Balas
Pré-estreia: 27 de março, às 20h.
Apresentações: 31/03 e 1,2,3,7,8,9 e 10/04
Horário: segundas e terças às 20hs e sábados e domingos às 17hs
Local: Teatro Coletivo – Rua Consolação, 1623 – Telefone: (11) 3255-5922
Entrada gratuita
Classificação: Maiores de 12 anos
Ingressos podem ser retirados com 01 hora de antecedência
Estacionamento Conveniado (R$ 8,00), Rua da Consolação, 1681
Oficinas
Local: TUSP – av. Maria Antônia, 294, Consolação.
Quando: 2 de abril, a partir das 9h.
Inscrições e informações: oficina.teatrooprimido@gmail.com
Sinopse do espetáculo
“Torquemada – 17 Balas”, uma releitura do texto “Torquemada” de Augusto Boal, refere-se à repressão policial, à violência do Estado, à impunidade e ao autoritarismo que se faz presente ainda hoje, fruto da história da sociedade brasileira e recorrente na história da humanidade. No espetáculo, após pronunciamento de Tomás de Torquemada, inquisidor espanhol da idade média, o público acompanha o relato descrito por Boal sobre a tortura que sofreu no período do regime militar e a leitura de parte de seu processo criminal de1971. Apeça segue para a atualidade e um jovem toma o lugar do “subversivo” da época, em uma jornada de acontecimentos pelos subterrâneos da violência atual nas periferias. Na dramaturgia proposta, as falas dos torturadores do passado estão presentes naqueles que violam os direitos humanos nos dias de hoje, trazendo à memória os “anos de chumbo” e sua influência na atualidade. O enredo é costurado por músicas compostas coletivamente pelo grupo, que garantem também momentos de descontração à peça. Ao final do espetáculo, o público é convidado a entrar em cena em busca de alternativas para o conflito apresentado, dando inicio ao exercício do Teatro Fórum.

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