O conto “O outro” se estrutura em
torno de um narrador que é ao mesmo tempo dois outros personagens. Há três
temporalidades se entrelaçando na narrativa: A narração dos fatos feita no ano
de 1972; a
personagem do velho, de 70 anos de idade, que situa o acontecimento em 1969; e a personagem jovem, com quase vinte anos de idade, que se situa no mesmo
acontecimento, em 1918.
De
início para o narrador, que se identifica com a personagem do velho, o fato ocorreu
num tempo de inverno (tempo da velhice) ao observar a correnteza de um rio com
pedra de gelo. A imagem do rio é a ponte para abrir o diálogo com a idéia de
tempo de Heráclito.
Para construção do dialogo, o acontecimento
fantástico começa a emergir na narrativa. O outro começa a ser construído
enquanto personagem e o seu reconhecimento se dá pela voz, que é a mesma. O
fantástico então está posto, o mesmo se divide em dois outros – um no ocaso da
idade de vida (70 anos) e o outro na aurora da vida (19 anos).
O
que Borges vai intuir nesse conto é o principio formulado do Heráclito de Éfeso, que também fora apelidado de "o Obscuro", da unidade permanente do ser
diante das transformações das coisas particulares e transitórias, posto que há
uma harmonia universal, que é gerada e construída pelas tensões.
Assim,
ao estabelecer a possibilidade do encontro entre dois momentos opostos da vida
de um mesmo ser - o ser jovem e o ser idoso –, em planos de temporalidade
diferentes – sonho e real –, Borges vai construir um diálogo que aponta as
diferenças e contradições, mas que também revela os pontos de harmonia do ser,
tal qual formulou Heráclito, ou seja, o outro que é o mesmo.
Nota: Interessante notar que, para os gregos, a "voz" era também entendida como a "luz" do homem: aquilo que o identivicava. Ao se perceberem por meio da voz, "os Borges" indicam isso. Professor Marcos Sidnei Pagotto-Euzébio, FEUSP, 2010.
http://casadapalavrasa.blogspot.com.br/2011/10/o-outro-de-jorge-luis-borges-traducao.html