sexta-feira, maio 25, 2007

OCUPAÇÃO USP - DIA 25 DE MAIO

Comentário Moisés: Comecei minha primeira graduação, em Ciências Sociais, no ano de 1981, na PUC/SP. Hoje, por força da minha profissão de professor voltei a estudar e sou estudante do primeiro anos de Pedagogia da Faculdade de Educação da USP. De dentro da sala de aula, inicialmente, acompanhei a evolução do movimento que começou com a ocupação no dia 3 de maio. Alguns professores abriram espaço para a discussão e algumas vezes os representantes do Centro Acadêmicos passaram na classe para informar o andamento do movimento. O eixo central da discussão são os decretos do Serra e a questão da autonomia da universidade. Na sexta-feira, dia 18/5, saímos da sala de aula e fomos para o saguão da Faculdade de Educação, onde cerca de 200 alunos aprovaram a greve dos alunos e uma agenda de atividades para essa semana. Até aqui o movimento tem sido vitorioso, pois conseguiu amplificar para a sociedade em geral a tensão interna, vivida na USP e nas universidades públicas paulistas, com a publicação dos decretos do governador José Serra no início do ano. Um lado negativo dessa amplificação é a forma imparcial como a grande mídia tem feita a cobertura do movimento, principalmente o rádio e a TV, que só destacam e se posicionam com as posições do governo. O lado positivo é o da intensificação do debate democrático sobre o modelo de universidade pública que se quer para o Estado de São Paulo, para além dos interesses corporativos das universidades e dos interesses políticos do governo de plantão. A rebeldia estudantil abriu um novo cenário e novos atores. Vamos ver no que dá. A seguir algumas analises parciais do movimento.


Fonte: Site PT - 23/05/2007 - www.pt.org.br/sitept/index_files/noticias_int.php?codigo=873
Ocupação da USP: limites para avançar -
Diogo Frizzo

Ocupa! Essa é a palavra de ordem entoada por centenas de estudantes nas assembléias e plenárias realizadas na USP desde a ocupação da Reitoria da Universidade, no dia 3 de maio.

A ocupação, motivada pela ausência da reitoria em um debate público e a posterior recusa em protocolar um documento com reivindicações estudantis, tomou grandes proporções e se tornou o centro do debate na comunidade uspiana.

Em princípio, os estudantes tinham uma única reivindicação: eles queriam uma audiência pública para debater os decretos do governador José Serra (PSDB) que ferem a autonomia universitária. Como a reivindicação foi aceita imediatamente pela reitoria, alguns setores sentiram a necessidade de apresentar uma pauta mais consistente, como forma de manter o movimento de ocupação. Esse foi o inicio o processo. É preciso lembrar que, historicamente, ocupações como esta sempre foram feitas para pressionar a reitoria a abrir negociação com os estudantes.

Desta vez a negociação foi mais tranqüila. Talvez, por isso, a precipitação de setores estudantis em querer estender o movimento com novas reivindicações.

Inexperiência ou oportunismo?
Desde que se iniciou a ocupação, a pauta sofreu modificações constantes, não para enxugá-la e garantir conquistas concretas, mas, sim, para adicionar pontos e reivindicações que muitas vezes demonstram uma intransigência por parte de setores do movimento que se intitulam a “direção autônoma” da ocupação.

As plenárias congregam muitos estudantes, fato que há tempos não acontecia no movimento estudantil, mas se perdem em questões secundárias, deixando para o final (depois de horas de discussão) o encaminhamento de questões centrais e aprovando resoluções muitas vezes controversas com um quorum muito reduzido, o que possibilitaria um questionamento sobre a legitimidade do que foi aprovado.

Partidos e os “Independentes”
Os partidos, em especial o PSOL e o PSTU, que insuflaram a ocupação, acreditavam que conseguiriam dirigir o processo e, com isso, talvez trouxessem novos militantes para suas fileiras. Mas foram percebendo que a cada dia isso se tornava mais difícil, primeiro o PSOL e depois o PSTU. O discurso antipartido domina o clima da ocupação. Não importa o mérito ou pertinência do debate que se tenta fazer: se o grupo é de alguma sigla partidária, já se torna alvo dos chamados “independentes”.

Com um discurso fácil de guerra aos partidos, afirmando que estes “manobram” as plenárias e impedem a participação dos estudantes, alguns setores se organizaram e tentam impor a linha da ocupação. Com isso aplicam seu jeito “independente” de fazer movimento estudantil: plenárias infindáveis em que as resoluções são aprovadas depois de esvaziadas; o patrulhamento ideológico na base do chavão “partido é mal”; a liberdade (somente para os independentes) de expressão; e, por fim, a lógica do “eu” me represento, que significa o não respeito às deliberações coletivas.

Setores esquerdistas como PCO e Estratégia Revolucionária não merecem muita analise, pois sempre operam na lógica do quanto pior melhor.

A ocupação
Após 20 dias, e com a ameaça de “desocupação” pela PM e o batalhão de Choque, o movimento chega a um dilema: manter a ocupação ou sair do prédio?

Os que insistem em defender a manutenção da ocupação se dividem em três grupos: os que acreditam que é possível avançar mais e que os pontos apresentados pela reitoria são insuficientes, pois a ocupação é um espaço de referência e, ao desocupar esse espaço, haveria desmobilização do movimento; os que querem ter um enfrentamento com a tropa de choque; e os que criaram um vínculo sentimental com a ocupação.

Partem da idéia da “última batalha”, do “agora ou nunca”. Muitos chegam a estar convencidos que se trata um novo “maio de 68”, só que em 2007. Não compreendem que a ocupação é um instrumento político, mas tem seu limite, seu ápice, e que, ao insistir em querer mais do que o necessário, o movimento se desgasta e se volta contra si próprio.

Cria-se uma falsa dicotomia, entre os que defendem a permanência da ocupação e são de “luta”, e os que defendem a desocupação e são os “pelegos”. Isso não está em discussão. É preciso pensar o que é melhor para o movimento, o que avança e aglutina.

Insistir na ocupação é se negar a perceber que pode ser difícil avançar mais do que já se avançou e que a reitoria chegou ao seu limite de concessão. Além disso, esse é o máximo que o movimento já conseguiu no último período. Colocar isso a perder, em troca de um enfrentamento com o choque, saindo sem ganho da ocupação, é desarticular o movimento.

A ocupação cumpriu o seu papel de organizar os estudantes e chamar a atenção da sociedade para a situação da universidade pública e dos decretos. O debate está na mídia e a pauta de reivindicações foi parcialmente aceita pela reitoria. O momento agora é outro: avançar para a construção da greve unificada entre alunos, funcionários e professores!

Do desfecho
O desfecho da ocupação pode acontecer nos próximos dias. O primeiro prazo venceu na terça-feira, dia 22, foi estendido até amanhã (24) e ainda podem haver novas negociações e novos prazos.

Mas o movimento precisa ter disposição de fato para negociar com a reitoria, priorizar pontos, enxugar a pauta, isso é, não continuar a incluir, a cada nova assembléia ou plenária, novas reivindicações (no primeiro momento era 5 pontos; agora são 17, sem contar os subitens).

Porém, o cenário de intransigência que se constrói, a partir do posicionamento de alguns setores, pode gerar uma grande derrota para o movimento estudantil, com nenhuma vitória e com a punição de muitos estudantes que participaram da ocupação, cenário que não ajuda em nada.

É possível sair da ocupação com um movimento organizado e em ascensão, com vitórias, capaz de construir uma greve com amplo apoio da sociedade e com uma grande participação estudantil, necessária para derrotar os decretos do governo Serra. Mas para isso, às vezes, é preciso falar o mais difícil, dizer que a ocupação já chegou ao seu limite e que continuar é um erro. Sair de mãos vazias não ajuda o movimento. Atrapalha, desmobiliza, desmotiva. Sair com conquistas reais agrega, mobiliza, impulsiona.

Por isso a palavra de ordem a partir de agora deve ser: desocupa!

Diogo Frizzo é graduando em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP) e militante da Juventude do PT.


Fonte: Site do PT - 25/05/2007 - www.pt.org.br/sitept/index_files/noticias_int.php?codigo=911
Ocupação da USP e os caminhos e descaminhos do movimento estudantil -
Ana Carolina Caldas

Dois artigos sobre a "Ocupação da USP" me chamaram a atenção nesta semana. Um escrito por uma estudante da mesma universidade e outro por uma jornalista da Folha de São Paulo.

O artigo "Os prós e os contras da ocupação na USP", assinado por Carla Santos (estudante de letras da USP, ex-presidente da UBES (2001) e membro da equipe do Vermelho - site oficial do PCdoB), é uma análise de quem já viveu "atos de rebeldia", que conhece como é que se organiza um movimento de protesto. Por "vício" e/ou hábito de quem faz/fez parte do movimento, a autora dá nome aos bois, ou melhor, diz quem é quem ou, melhor ainda, define com ressalvas quem está lá ainda resistindo (ou que resistiram) na ocupação da USP. Identifica como uma boa militante partidária quais as forças também partidárias ali comandando o movimento. Informa em seu artigo que a maioria dos estudantes ligados ao DCE (Diretório Central dos Estudantes) e aos partidos, após a aceitação pela Reitora da USP de alguns pontos da pauta de reivindicações, resolveram se retirar do movimento de ocupação.

Segundo Carla Santos, para os que ficaram, "se iniciava a grande chance de começar o caminho rumo à revolução socialista no Brasil, ou pelo menos quase isso, colocando a sua vida à disposição da tropa de choque para mais tarde, quem sabe, ser um neo-Alexandre Vanucci Leme (estudante da USP assassinado na ditadura de 64)."

A impressão que tive é que neste artigo há um alerta para uma possível descaracterização do movimento estudantil consolidado pelas forças partidárias.

Já o artigo escrito pela jornalista Laura Capriglione - "25 anos depois, estudante leva a mãe para a invasão", publicado na Folha São Paulo, o tom é outro: evidencia e quase que inaugura (?) uma nova fase do Movimento Estudantil, quando afirma que a ocupação é "promovida" por estudantes que nada têm a ver com as entidades estudantis. Além disso, sinaliza que ali é "ninguém manda, todo mundo manda", ou seja, não existe cacique, liderança. Pelo que parece e o que a explicação do "artigo militante" tenta elucidar, é isso mesmo que está acontecendo. A estudante caracteriza a atitude dos colegas também estudantes de irracional ("Se por um lado a ocupação da reitoria da USP deixou de ter um sentido racional..."), pois começou apenas como uma visita para a reitora com o objetivo de entregar uma carta de reivindicações e agora ainda não estão claro quais são as futuras estratégias.

Carla Santos, que faz o alerta sobre a irracionalidade do movimento e a falta de liderança na ocupação, mas também identifica que algo importante está acontecendo mesmo que tenha começado sem querer e sem estratégias demarcadas, foi líder secundarista e ficou famosa é claro por sua competência política e por um ato de rebeldia noticiado nacionalmente em 2001. Ficou nua em frente ao Palácio do Planalto como forma de protesto. Só com uma faixa cobrindo os seios, a "bunda-pintada" entrou no espelho d água do Congresso, organizou os estudantes para formar a palavra CPI no gramado e discursou. Tratava-se do protesto a favor da CPI da Corrupção e contra a lei que acabou com o passe livre nos ônibus municipais.

QUE A LOUCURA SE REESTABELEÇA...

Inspirada nos protestos da vida das caras ou bandas pintadas, nesta ocupação da USP e em outros atos de rebeldia sem violência, mas para promover mudanças... é que defendo e continuarei sempre defendendo - que a irracionalidade, a paixão, o ímpeto continuem PELO AMOR DE DEUS a fazer parte do MOVIMENTO ESTUDANTIL. Que os militantes do Movimento Estudantil deixem a racionalidade para quando virarem burocratas talvez (e espero que não virem...).

Mas não o sejam agora, não queiram antecipar algo que não deveria fazer parte deste momento em que se é jovem, em que se experiência situações para bater a cabeça errando ou acertando... Não deixem que os profissionais já consolidados desta área do Movimento Estudantil ou a crença que movimento estudantil deve funcionar como uma empresa, como um partido ou qualquer outra coisa que se assemelha a "fina flor da burrocracia" contaminem suas rebeldias, paixões e até a sua imaturidade.

Se estão lá sem saber que estariam, se não planejaram, se não sabem ainda para onde vão... continuem apenas caminhando. Apenas caminhem sabendo que querem mudar algo, que são contra os decretos do Serra e que a racionalidade está no dia a dia da ocupação, como já foi noticiado - em deixar tudo limpo, em se organizar para definir o próximo dia e continuem caminhando... e por que não.. sem pensar quem são, se do partido A ou B. Afinal são estudantes impetuosos, apaixonados, rebeldes das suas causas.

A ex-líder secundarista e ex presidente da UBES informa em seu artigo que "professores, diante da irredutível permanência de algumas correntes políticas do movimento estudantil na ocupação, passaram a buscar mais diálogo com os estudantes, as assembléias passaram a ser cada vez maiores e nesta quarta (23) também aderiram à greve em apoio à ocupação." Não sabiam onde iriam parar, mas com sua irredutibilidade engrossaram o movimento contra os decretos do Serra e a favor da qualidade de ensino. São nos momentos de loucura, do irracional que o "caldo pode engrossar" ou pode não também. Vai saber...

Sou a favor que a essência do Movimento Estudantil se restabeleça. Nesta fase somos aprendizes e precisamos errar muito para ter certeza que valeu a pena. Que venham outros atos de loucura, este tipo de loucura pacífica, brincalhona, irreverente que é assim sem saber direito o que vai acontecer... que só aconteceu porque não se pensou com as amarras de quem já não sonha mais, não se raciocinou sobre os dogmas do partido A ou B, sobre isso ou aquilo. Foram pacíficos e a partir do momento que ocuparam a reitoria começaram a se organizar... assim meio com medo, meio sem saber ainda como é que se organiza.

Sê jovem agora, para continuar sendo até a eternidade

"Enfim, os questionamentos eram muitos, mas a empolgação em estar fazendo algo para mudar a situação da universidade era muito maior", informou Carla Santos sobre o clima inicial da ocupação. Sim! Eu sou a favor da leveza, da adrenalina, da sensação revolucionária que toma conta da gente quando se é estudante e provoca mudança de estado, de espírito, de consciência e aí a coisa começa, ou seja, a gente começa a se dar conta que tem força, que tem poder. Aí sim a gente se organiza, se desorganiza e sai da Universidade. Vira adulto com espírito jovem e de vez em quando relembra disso tudo e vai lá como o Arthur Poerner se unir aos estudantes na ocupação do terreno da Une (essa é uma loucura que vem dando certo!), se inspira e desenha um projeto para o Teatro da Une como fez o Oscar Niemeyer, vai lá e vira Ministro dos Esportes como o Orlando Silva, vira o Ministro da Comunicação Franklin Martins, etc, etc. Mas antes a gente tem que ser, viver e agir como estudante!

Marcelo, aluno da escola de ciências sociais da USP, citado no artigo da jornalista Laura Capriglione, disse: "A gente não sabe muito o que é ser rebelde. Só sabe que é contra o decreto do Serra. O resto estamos aprendendo". Não são os estudantes de agora que não sabem o que é ser rebelde, rebeldia se experimenta em qualquer época quando lhe é permitido dentro dessa coletividade, do movimento ou dos movimentos estudantis.

Deixem para crescer quando saírem da Universidade... Agora apenas caminhem e vão aprendendo ....Depois a gente escolhe qual é a melhor da estratégia pro futuro.

Parafraseando a música "Epitáfio"... "eu deveria ter arriscado mais, complicado menos..." Quando olho para trás e lembro que um dia, em 1996, dormi dento da Universidade também para lutar a favor da autonomia da Universidade... fico feliz por ter tido o privilégio da participação no Movimento Estudantil . Participação esta que hoje me dá serenidade e a certeza que estou na torcida certa. Torço para que os estudantes de hoje arrisquem mais....compliquem menos!

E Viva os Estudantes!

Para terminar, ou melhor, ao terminar o que aqui escrevo informo que acabei de ler a seguinte notícia publicada há poucos minutos na internet: "Um grupo de estudantes da Ufal (Universidade Federal de Alagoas) ocupou nesta quinta-feira (24), pela manhã, o gabinete da reitora, Ana Dayse Dórea, no campus de Maceió. Os estudantes são contra a reforma universitária; querem que a escola técnica agrotécnica seja voltada para os interesses da agricultura familiar (e não a monocultura da cana-de-açúcar); pedem a ampliação do restaurante universitário e da residência universitária, além de uma creche gratuita nas dependências da universidade; e são contra os cursos pagos e a cobrança de quaisquer taxas acadêmicas" (Site Uol, 23/05/2007).

Ana Carolina Caldas - ex Coordenadora do DCE UFPR (96-97) - formada em Pedagogia (UFPR), Mestra em História da Educação (UFPR) e atualmente estudante de Jornalismo (PUC/PR). Atuou também na Coordenação do Setorial de Cultura do PT de Curitiba. É autora da dissertação de mestrado "CPC da UNE no Paraná (1959-1964): encontros e desencontros entre a arte, educação e política".

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Fonte: Portal O Vermelho - www.vermelho.org.br/base.asp?texto=18505 - 24/05/2007.

Os prós e os contras da ocupação na USP

No dia 3 de maio o DCE convocou uma assembléia de estudantes no anfiteatro da Geografia da FFLCH. O objetivo da discussão era reunir a comunidade universitária para debater os decretos do governo Serra para a educação paulista. Eu, como milhares de estudantes trabalhadores da universidade, não pude comparecer ao debate que culminou com a ocupação da reitoria em função da ausência de seus representantes ao encontro. Hoje, a ocupação é fato nacional, porém pouca gente sabe como ela realmente se construiu e ninguém sabe aonde ela vai dar. Por trás da unanimidade dos estudantes no apoio à ocupação, escondem-se polêmicas das quais é preciso se falar.

Por Carla Santos*

Serra atirou no pé quando lançou decretos

1º Capítulo: a ocupação

Ao chegar na universidade para a primeira aula da manhã de sexta-feira (4) um colega contou-me sobre o que havia acontecido na assembléia do dia anterior. Relatou que cerca de 300 estudantes haviam participado da assembléia que começou para debater os decretos e terminou no gabinete da reitora. Ansiosa por mais informações sobre o ocorrido, procurei as lideranças das entidades estudantis e colegas que haviam participado da atividade.

As fontes de informação passaram por independentes, os diretores do Diretório Central dos Estudantes (DCE) – do qual participam a UJS, correntes do PT, MR8 e independentes – e pelo Centro Acadêmico Estudantil de Letras Oswald de Andrade (Cael) – liderado por militantes do PSTU.

Para minha surpresa, nada do que aconteceu foi previamente calculado. Meus colegas informaram que como a reitora não havia enviado nenhum representante ao debate, todos saíram do anfiteatro em direção à reitoria para entregar uma carta, redigida às pressas, cobrando uma posição da reitora Suely Vilela sobre os decretos. Como a reitora se encontrava na Espanha (suspeita-se que para fechar convênios da universidade com o banco Santander), os estudantes resolveram ocupar o gabinete da reitora. Apesar da intimidação da guarda universitária – que antes da chegada dos 300 manifestantes já havia se posicionado no local – a ocupação foi relativamente pacífica, tendo quebrado apenas a porta de entrada da reitoria e a porta que dá acesso ao gabinete da reitora. O aspecto de depredação que aparece nos jornais não se deu em função da ocupação, e sim pelas obras realizadas pela universidade no local desde o início deste ano.

De imediato, o vice-reitor Franco M. Lajolo chegou ao local. Dizem que, trêmulo, solicitou aos estudantes a pauta de reivindicações. Atônitos, os estudantes solicitaram a Lajolo que voltasse mais tarde, pois era necessário fazer uma assembléia com os ocupantes para definir a pauta de reivindicações da ocupação. Dois ou três militantes rapidamente construíram uma pauta com 13 reivindicações que foi aprovada às pressas pelos estudantes presentes. Começava ali a novela da negociação.

2º Capítulo: as negociações

Embora o DCE e inúmeros centros acadêmicos tenham participado da ocupação, não havia ainda uma posição oficial das entidades estudantis. Na sexta-feira (4), ao fazer a primeira visita à ocupação, a falta de liderança no movimento já era clara. Para buscar uma foto do que aconteceu no dia anterior tive que me dirigir a cinco estudantes diferentes. Era grande o medo de que a informação sobre a depredação da reitoria, alardeado erroneamente pelos grandes veículos de informação, se propagasse.

Vi muitas lideranças do movimento estupefatas com a enorme estrutura à sua frente. Computadores, sofás, café, mesas, cadeiras, todos gozavam do prazer de sentar no trono do poder institucional máximo da universidade, a cadeira da reitora. Muitos também estavam cambaleantes: não é fácil dormir no chão duro, ao som de violão e sabe-se lá o que mais, durante aquilo que para a ampla maioria representava a primeira aventura em uma ocupação.

Já no dia seguinte circulavam muitas informações, boatos de todo tipo se propagavam como fábulas pelos corredores das faculdades. Aquela sexta-feira iniciaria um longo processo de negociação entre os estudantes e a reitoria. No meio dos estudantes, muitas perguntas: “Meu, como eleições diretas para reitor não entrou na pauta de reivindicação?”, “Mas de onde propomos vir esse dinheiro para moradias?”, “Por que contratação de professores e não abertura imediata de concurso público?”; enfim, os questionamentos eram muitos, mas a empolgação em estar fazendo algo para mudar a situação da universidade era muito maior.

Quando a reitora aportou no Brasil, a maioria das entidades da universidade, do Brasil e até do mundo (o PSTU adora dizer isso!) já apoiavam a ocupação. Uma comissão de negociação com mais de 10 estudantes foi aprovada em assembléia – é claro, assembleísmo é o esporte preferido da turma – e a pauta dos estudantes foi levada à mesa. Depois de idas e vindas, a reitora apresentou uma contraproposta comprometendo-se verbalmente com 7 das 13 reivindicações apresentadas pelos estudantes.

Para muitos, ali foi o ponto final da ocupação, afinal era uma conquista razoável arrancar da reitora 7 de 13 pontos previstos na pauta. Já para outros, se iniciava a grande chance de começar o caminho rumo à revolução socialista no Brasil, ou pelo menos quase isso, colocando a sua vida à disposição da tropa de choque para mais tarde, quem sabe, ser um neo-Alexandre Vanucci Leme (estudante da USP assassinado na ditadura de 64).

Capítulo 3: A ocupação continua

A primeira contra proposta da reitora levou a um realinhamento de posições no movimento estudantil sobre a ocupação. O DCE divulgou nota retirando-se da ocupação. O PSTU e o P-SOL também se retiraram dias depois.

A Liga Estratégica Revolucionária (LER) e o Movimento Negação da Negação (MNN) —forças políticas que só existem no mundo pequeno da USP— passaram a insuflar independentes contra partidos políticos. No interior da ocupação, o debate antiparticipação de estudantes ligados a partidos passou a ter quase a mesma importância que o debate sobre os decretos.

Ao mesmo tempo, a repercussão sobre a ocupação foi crescendo na imprensa e conseqüentemente na universidade. Funcionários (liderados pelo PSTU) já haviam entrado em greve. Os estudantes então deflagraram a sua greve em assembléia com mais de 2 mil pessoas. Instalou-se um clima pró-greve geral e mobilização no ar. Professores, diante da irredutível permanência de algumas correntes políticas do movimento estudantil na ocupação, passaram a buscar mais diálogo com os estudantes, as assembléias passaram a ser cada vez maiores e nesta quarta (23) também aderiram à greve e ao apoio à ocupação.

Capítulo 4: Aonde a ocupação vai parar?

Se por um lado a ocupação da reitoria da USP deixou de ter um sentido racional, de conquistas concretas, por outro lado, ela passou a encorajar os mais diversos setores da universidade a se levantarem contra os decretos do governador Serra. A polêmica sobre a autonomia das universidades estaduais paulistas tomou conta dos noticiários. Governo e seus séquitos, os reitores indicados por Serra, passaram a se contradizer nas declarações sobre o tema. No mesmo dia em que o Secretário Estadual de Ensino Superior, Aristodemo Pinotti, afirma publicamente que os recursos da universidade terão que passar pelo crivo do governo, o Conselho de Reitores solta nota publica dizendo o contrário.

Desesperado, o governo anunciou a contratação de 1.900 professores para a USP no meio da crise. A reitora já não sabe mais o que oferecer, por mais que tente, não há proposta que convença os estudantes a se retirarem da ocupação. O governo está na defensiva e a comunidade das universidades estaduais paulistas fortemente mobilizada contra seus decretos.

Nesta quinta-feira (24), o governo poderá tomar uma medida radical para conter a crise. A tropa de choque já anunciou que não vê a hora de intervir na ocupação e utilizar da violência para desocupar a reitoria. Por outro lado, professores aprovaram nota pública solicitando a continuidade do diálogo e a retirada da polícia das negociações da ocupação.

Se optar pela força, Serra estará reforçando a caracterização de um governo repressor que já pesa sobre seu mandato desde a violenta repressão aos protestos contra a visita de Bush, no último dia 8 de março. Se deixar tudo como está, o movimento antidecretos pode crescer ainda mais e talvez se refletir, ainda que momentaneamente, em uma mudança ou outra em seu mandato, já que na política “nada como um dia após o outro”.

A sinuca de bico está armada e caberá aos estudantes e à comunidade das universidades estaduais paulistas saber negociar, não mais com a reitora da USP, e sim com o governador Serra sobre saídas para o impasse.

*Carla Santos é membro da equipe do Vermelho e estudante de Letras da Universidade de São Paulo (USP)

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Fonte: Folha de São Paulo - Cotidiano - 23/05/2007 - www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2305200706.htm

25 anos depois, estudante leva a mãe para a invasão Pregando o apartidarismo, grupo invasor desdenha das entidades tradicionais de estudantes e dos líderes carismáticos

Novo movimento estudantil é bem diferente daquele da invasão da reitoria da USP de 82


Marlene Bergamo/Folha Imagem
Alimentos são distribuídos a estudantes na reitoria da USP, invadida há 20 dias; alunos poderão ser presos caso não deixem o local

LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL

E de repente, de surpresa, um novo movimento estudantil surgiu na Universidade de São Paulo. Ele tem uma cara mulata como não se via nos anos de chumbo da ditadura militar. Ele dá as costas às entidades tradicionais de estudantes, como a UNE, a UEE e o DCE-Livre. Ele desdenha de líderes carismáticos (em vez disso, todo mundo manda, e ninguém manda). Ele cultiva a sério o apartidarismo, quebrando a hegemonia política de partidos como o PT, PSOL e PSTU, que já foram manda-chuvas no pedaço. E, esquisitíssimo, ele faz questão de cuidar dos jardins com tanto esmero quanto da mobilização.
Esse novo movimento estudantil apareceu há 20 dias, quando 120 alunos dirigiram-se à reitoria da universidade para entregar um documento com reivindicações. Como não encontraram a reitora Suely Vilela, que estava viajando, resolveram invadir o local _assim, meio na louca. E a coisa começou a crescer, sem controle, e sem interlocutores.
União Nacional dos Estudantes, que foi presidida pelo atual governador José Serra nos idos de 1964, União Estadual, Diretório Central dos Estudantes e muitos centros acadêmicos, as organizações estudantis tradicionais nem são mencionadas nas conversas. Não existem para essa mobilização, senão como "obstáculos" que foram necessários ultrapassar. O aluno de letras Marcelo explica: "Eles foram contra a ocupação da reitoria e ficaram negociando nas nossas costas".

"Caminhando e cantando"
Ontem, o carro de som estacionado bem na frente da invasão tocava a trilha sonora do pessoal. "Eu sou a mosca que pousou na sua sopa" e "Plunct, plact, zum, não vai a lugar nenhum", as duas canções de Raul Seixas, alternavam-se com todas as músicas antigas de Chico Buarque, com especial destaque para "Apesar de Você", e "Pra não Dizer que não Falei das Flores", de Geraldo Vandré, hinos da resistência democrática nos anos do regime militar. Túnel do tempo?
Quem, há 25 anos, em 1982, quando a reitoria da USP também foi invadida, imaginaria um estudante levando sua mãezinha para ver como os companheiros se comportavam bem na luta? Pois foi isso o que o aluno Luiz, do segundo ano de história, fez: levou a mãe, conflito geracional nenhum, para checar como tudo estava organizado na reitoria, apesar da invasão. "Ela gostou muito do que viu", garante ele.
Ontem, em visita ao prédio ocupado, os estudantes que ciceroneavam a reportagem da Folha fizeram questão de mostrar os banheiros da reitoria. "Tudo limpinho, você está vendo", disseram. Estava mesmo. Os jardins internos do prédio, de tão bem cuidados, mereceram elogios do jardineiro responsável, que foi preocupado ao local só para checar as perdas e danos da invasão. Em vez disso, fez questão de parabenizar o aluno que o estava substituindo tão bem.
O pessoal faz cara de mau quando alguém da "imprensa burguesa" (como muitos consideram, por exemplo, a Folha) pede entrevista. Dura pouco. Foi só a comissão de mobilização avisar que mais uma assembléia ia começar para um grupo de jovens músicos (duas flautas doces, uma clarineta, um violino, um cavaquinho e dois pandeiros) começar a tocar "Se esta rua, se esta rua fosse minha, eu mandava, eu mandava ladrilhar". Foi a senha. Cinco grandes rodas concêntricas, formadas por adolescentes de mãos dadas, começaram a dançar. Então vieram um Caetano velho, ainda bucólico, "Asa Branca", de Luiz Gonzaga, e o hit "Apesar de Você", sempre ele. Aquecida pela coreografia, a assembléia, então, finalmente se iniciou.

Cama coletiva
Há muitos negros na invasão, como não se via na de 25 anos atrás. Se antes ingressavam na universidade 4.000 novos alunos por ano, hoje são 10 mil. Cabelões black de todas as formas, os universitários do grupo "OcupAção Afirmativa" refletem a abertura pela qual passou a USP no último quarto de século. Mas eles querem mais.
O politicamente ultracorreto domina. No amplo saguão que antecede a sala do Conselho Universitário, onde estão distribuídos os colchões em que os invasores dormem, tudo é de todos. A estudante Alba Marcondes explica: "Chegou, encontrou o colchão vazio, qualquer um, então pode se deitar".
O politicamente ultracorreto domina. No amplo saguão que antecede a sala do Conselho Universitário, onde estão distribuídos os colchões em que os invasores dormem, tudo é de todos. A estudante Alba Marcondes explica: "Chegou, encontrou o colchão vazio, qualquer um, então pode se deitar".
Todos comem a mesma comida, feita por outra comissão de alunos. Ontem, o cardápio do almoço foi arroz branco, batata cozida e lingüiça frita. Acompanhava um minicopinho (desses de café) de suco de caju. Ninguém reclamava.
E sexo? Luís conta que um velho militante de 25 anos passados, ao visitar a invasão atual, notou um certo ar "careta" nos meninos e perguntou "Pô, nem sexo, nem drogas, nem rock and roll? Que merda vocês estão fazendo?" Marcelo, aluno da escola de ciências sociais, emenda, pensativo: "A gente não sabe muito o que é ser rebelde. Só sabe que é contra o decreto do Serra. O resto, estamos aprendendo".

Clandestinidade
Lá fora, a USP, naquele que é o seu centro geográfico de poder, o conjunto da reitoria, parece o centro comunitário de um pedaço da periferia. O prédio em obras, o matagal crescendo nos canteiros do conjunto residencial (onde moram alunos carentes), as lonas improvisadas, proteção para a chuva, como em um acampamento de sem-teto, os pneus empilhados à guisa de barricada, as muitas pichações ("Ocupe a Reitoria que Existe em Você" é uma delas), uns tantos bêbados em volta, um pequeno comércio de doces e camisetas.
Os estudantes em tempos de democracia não gostam de mostrar rostos nem declinam nomes. Identificam-se por um prenome, às vezes confessando, antes que se pergunte, que é falso. Temem punições administrativas, que podem chegar à expulsão do quadro discente.
Há 25 anos, a ditadura ainda existia no país _era o governo do general João Baptista Figueiredo (1918-1999)_, mas a confiança do movimento estudantil era tamanha que todos queriam aparecer. Um grupo de alunos do Instituto de Física, então uma das escolas mais ativas da USP, como lembra o ex-aluno Olavo Tomohisa Ito, 48, hoje professor universitário, fez questão de "tomar posse" da sala do Conselho Universitário, afixando, gigantesca, uma faixa com os dizeres "Espaço Marcelão", em homenagem a um colega que até pelo tamanho não conseguia se manter incógnito. Ninguém queria mais a clandestinidade.
Nesses dias de invasão, uma parte da turma de 25 anos atrás fez questão de ir ver como os meninos de hoje estão levando a coisa. Julio Cesar, ex-aluno de ciências sociais e atualmente na Faculdade de Educação, ontem ajudava o pessoal da comissão de alimentação. Outros da mesma época levavam doações de mantimentos.

terça-feira, maio 22, 2007

LIVROS SOBRE OS NEGROS DO CEAO

Comentário Moisés: Por indicação do meu amigo Milton do Fórum de Educação da Zona Leste, conheci o site do Centro de Estudos Afro-Orientais - Universidade Federal da Bahia www.ceao.ufba.br/2007/index.php - com riquíssimo material de pesquisa sobre o Negro no Brasil. Abaixo relaciono alguns livros que estão à disposição para cópia eletrônica. Axé!
Livros & Vídeos
DOWNLOAD DE LIVROS

LITERATURA AFRO BRASILEIRA

Florentina Souza e Maria Nazaré Lima (orgs.)

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Livor inteiro (10.649 kb)
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DE OLHO NA CULTURA: PONTOS DE VISTA AFRO-BRASILEIROS

Andréa Lisboa de Souza
Ana Lucia Silva Sousa
Heloisa Pires Lima
Marcia Silva

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Livor inteiro (3.934 kb)
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UMA HISTÓRIA DO NEGRO NO BRASIL

Wlamyra R. de Albuquerque
Walter Fraga Filho

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Livor inteiro (21.134 kb)
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Magistério e sofrimento psíquico: contribuição para uma leitura psicanalítica da escola

Comentário Moisés: Já chegamos ao mês de maio e nas conversas com meus colegas educadores o peso do trabalho já é sentido. Na escola onde trabalho muitos professores já tiraram licença médica e outros estão em vias de. O problema é grave e por isso tenho publicado vários artigos nesse espaço para nossa reflexão e ação. Este é mais um texto interessante, que recebi da Comunidade Virtual Escrevendo o Futuro (http://escrevendo.cenpec.org.br/twiki/bin/view/Links/WebHome) e achei interessante socializar. Axé!

Fonte: Site Scielo - acessado em 22/05/2007 - www.proceedings.scielo.br/scielo.php?pid=MSC0000000032001000300031&script=sci_arttext

Colóquio do LEPSI IP/FE-USP - Psicanálise, infância e educação
An. 3 Col. LEPSI IP/FE-USP Oct. 2001

Cláudia Murta - Pedagoga, Mestra em Educação, Professora da Universidade da Amazônia - Unama e da Universidade do Estado do Pará - UEPA.

Há alguns anos trabalhando em projetos de formação continuada de professores, meu interesse e disposição em escutar as pessoas tem-me possibilitado acolher e registrar as mais diversas queixas e relatos de sofrimento de professores.

Quando encontram uma oportunidade, e sentem que podem confiar na pessoa que os escuta, eles falam de si. Costumam dizer, de saída, que são felizes com a escolha de ser professor. Misturam suas histórias pessoais com acontecimentos da vida profissional, histórias de seus filhos com as de seus alunos. Aos poucos, não raro, choram, contam de suas raivas, decepções e ressentimentos. Revelam uma outra face da sua vida de professores: falam em angústia, escuridão, doença, dor. Descrevem o magistério como um lugar de sofrimento.

Que mal-estar é esse que tem se apresentado insistentemente no âmbito da escola?

Na última década, o tema do sofrimento ou mal-estar docente tem sido objeto destacado de análise no campo da educação.

Codo (1999), estudando a saúde mental e o trabalho do professor, referiu-se a uma síndrome de desistência do educador, que pode levar à falência da educação: o 'burnout'.

O burnout é uma espécie de resposta ao stress laboral crônico. Ele é expressão do sofrimento psíquico e da deterioração afetiva da pessoa, que prejudica sua relação com o trabalho, com as instituições ou organizações, com as outras pessoas.

Segundo Codo e Vasques-Menezes (1999), o burnout "é uma síndrome através da qual o trabalhador perde o sentido da sua relação com o trabalho, de forma que as coisas já não o importam mais e qualquer esforço lhe parece ser inútil. Esta síndrome afeta, principalmente, profissionais da área de serviços quando em contato direto com seus usuários. Como clientela de risco são apontados os profissionais da educação e saúde, policiais e agentes penitenciários, entre outros. Schaufeli et al. chegam a afirmar que este é o principal problema dos profissionais de educação" (p. 238).

Diniz (1998), em seu estudo sobre o sofrimento de mulheres-professoras das séries iniciais do ensino fundamental, refere-se a um insuportável vivido por elas na educação. A subjetividade da mulher nessa profissão foi estudada por essa autora a partir das queixas de professoras, queixas que revelam sua vivência de um profundo mal-estar.

Na escola, as professoras se queixam das condições de trabalho, dos alunos, do salário. Mas nos consultórios, para os médicos que lhes concedem licenças para tratamento de saúde, as queixas e sintomas apresentados mais frequentemente são outros: "diarréia, pressão alta, vômito, dores na nuca, na cabeça, na coluna, nas costas, dormência nas mãos, irritabilidade, choro fácil, depressão, ansiedade, insônia" (p. 203).

As professoras queixam-se de que sofrem e adoecem. Quando adoecem, afastam-se da sala de aula e, às vezes, definitivamente, da escola.

Diniz investigou o adoecimento mental de professoras em desvio de função2. Em sua pesquisa ela procurou, nos laudos que concederam licença médica às professoras, as explicações clínicas que justificaram o afastamento das mesmas de sala de aula: os transtornos mentais aparecem como o segundo motivo mais frequente para a concessão de licenças médicas aos educadores da Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte, revela a sua pesquisa.

Mas a escola é essencialmente, do ponto de vista sociológico, o lugar do ordenamento, da estabilidade, do controle, da transparência, da não-contradição. Por isto, nela, o mal-estar, o conflito, a desordem, o desequilíbrio são recusados. A escola resiste em reconhecê-los e acolhê-los, pois teme ser desestabilizada por eles.

Mas essa negação de qualquer mal-estar, pela escola, tem consequências: "a instituição, quando sutura o mal-estar, transforma-se [ela mesma] em fonte de mal-estar" (Diniz, 1998, p.205).

Fontoura (1992), ao procurar compreender o ser professor de História do ensino secundário em Portugal, interrogando pelos motivos que levaram alguns desses profissionais a essa profissão e a nela permanecerem, também se refere a um mal-estar dos professores. Esse mal-estar, segundo Fontoura, está relacionado à crise atual da educação frente a um mundo de rápidas e contínuas transformações sociais, econômicas, políticas e culturais, que leva a uma crise de identidade na profissão docente.

No meio dessa crise vivida na profissão, não sem sofrimento, o professor pergunta-se: fico ou vou-me embora? Incerteza entre dois caminhos em que mesmo a alternativa de ficar não descarta a assunção de uma certa desistência do trabalho docente.

Esteve (1999), também analisa o tema mal-estar docente, expressão assim por ele definida: "um conceito da literatura pedagógica que pretende resumir o conjunto de reações dos professores como grupo profissional desajustado devido à mudança social" (p. 97). Esteve prossegue: "A expressão mal-estar docente (malaise enseignant, teacher burnout) emprega-se para descrever os efeitos permanentes, de caráter negativo que afetam a personalidade do professor como resultado das condições psicológicas e sociais em que exerce a docência, devido à mudança social acelerada" (p. 98).

Para Esteve, esse mal-estar está articulado ao intenso processo de mudanças sociais que vêm ocorrendo em todo o mundo nos últimos anos e às dificuldades da escola em caminhar pari passu a esse processo. Os professores são parte de um quadro de profundas mudanças sociais, situação que corresponde a mudanças não menos profundas na educação e no desempenho exigido da profissão docente.

Esteve indica as principais consequências do mal-estar docente, organizadas e apresentadas a seguir em ordem crescente do ponto de vista qualitativo, e decrescente do ponto de vista quantitativo, ou seja, do número de professores afetados: "1. Sentimento de desajustamento e insatisfação perante os problemas reais da prática do ensino, em aberta contradição com a imagem ideal do professor; 2. Pedidos de transferência, como forma de fugir a situações conflituosas; 3. Desenvolvimento de esquemas de inibição, como forma de cortar a implicação pessoal com o trabalho que se realiza; 4. Desejo manifesto de abandonar a docência (realizado ou não); 5. Absenteísmo laboral, como mecanismo para cortar a tensão acumulada; 6. Esgotamento, como consequência da tensão acumulada; 7. "Stress"; 8. Ansiedade; 9. Depreciação do eu. Autoculpabilização perante a incapacidade de ter sucesso no ensino; 10. Reações neuróticas; 11. Depressões; e 12. Ansiedade, como estado permanente associado em termos de causa-efeito a diagnósticos de doença mental" (Id., p. 113).

Dejours (1994), analisa as relações existentes entre trabalho, prazer e sofrimento a partir da organização do trabalho. Para ele, existe um "paradoxo psíquico do trabalho": este é, para uns, fonte de equilíbrio; para outros, causa de fadiga e sofrimento.

Em uma abordagem econômica do funcionamento psíquico, Dejours considera que, para constituir-se como fonte de equilíbrio, a tarefa executada no trabalho deve proporcionar ao trabalhador a descarga apropriada de sua energia psíquica acumulada. O trabalho é equilibrante quando possibilita a diminuição da carga psíquica e é fatigante quando obstaculiza essa diminuição. Daí a importância, para a saúde psíquica do trabalhador, de um trabalho livremente escolhido ou livremente organizado, uma vez que as vias de descarga, nesses casos, vão estar mais adaptadas às necessidades do trabalhador.

Essa conclusão de Dejours traz à tona a questão da "livre escolha do ofício". Na impossibilidade de uma livre escolha, e se não é mais possível ao trabalhador ao menos o rearranjo da organização de seu trabalho, advém o sofrimento, ele diz. É que, não encontrando possibilidade de descarga, a energia pulsional fica acumulada, provocando sentimento de desprazer e tensão. Essa energia fixa-se no corpo, num processo de somatização da carga psíquica acumulada, podendo desencadear graves perturbações. Se não houver, no modo de organização do trabalho, oportunidades imediatas de descarga da energia pulsional, produzem-se patologias. Dependendo da estrutura mental do indivíduo, duas modalidades de patologias são possíveis: a descompensação psiconeurótica e a descompensação somática.

Como poderíamos pensar essa relação entre trabalho e sofrimento no âmbito da profissão docente, em que a organização do trabalho, numa primeira análise, não parece ser assim tão rígida e autoritária?

Deve-se observar que não há, na literatura até aqui indicada, indícios de que o mal-estar dos professores esteja ligado exclusivamente a fatores conjunturais (mais imediatos) da educação. Antes, as análises mais frequentes sugerem ser mais plausível levantar-se a hipótese de que este mal-estar seja uma manifestação de um mal-estar mais estrutural da educação que, por sua vez, nos remete ao estrutural "mal-estar na civilização", já apontado e analisado por Freud (1930).

Por que tanto adoecem os professores no exercício do magistério? Por que o inevitável, muitas vezes, é a construção de uma relação de sofrimento com o trabalho? Por que muitos desistem e a que custos emocionais outros permanecem?

Em meio a essas perguntas, uma pista a seguir: a consideração do sofrimento psíquico no magistério como um sintoma que denuncia, por sua vez, um mal-estar na educação, e o correspondente conflito vivido pelos professores na escola.

É minha hipótese que o sofrimento dos professores, as suas queixas frequentes quanto ao insuportável trabalho docente e, no limite, o seu adoecimento expressam, sintomaticamente, a situação de abandono em que se encontra a escola; sugerem uma certa desistência da educação enquanto projeto de preparação de crianças e jovens para que encontrem o seu lugar no mundo adulto. Desistindo da realização do projeto educativo, os professores, na verdade, estariam se demitindo de sua posição de educador e, em decorrência, renunciando ao ato educativo, como diz Lajonquière (1999). São as crianças, na escola, que mais sofrem os efeitos de tais posturas.

O sintoma deve ser interpretado como um substituto, disfarçado e deformado, de um desejo, de uma idéia reprimida, de algo que, inconscientemente, os professores negam em si mesmos; resultado de uma elaboração psíquica, ele é a expressão de um conflito. Enquanto tal, o sofrimento psíquico de professores deve ser tomado como expressão de um conflito por eles vivido no âmbito dessa profissão, situação que, por sua vez, denuncia um mal-estar mais profundo e abrangente.

Uma vez que o sofrimento psíquico dos professores pode ser tomado como um sintoma, ele pode ser interpretado como uma formação de compromisso (acordo de conciliação) que lhes possibilita sua permanência nessa profissão. Conviver com o sofrimento, e com tudo o que, negativamente, ele desencadeia, talvez seja a única maneira encontrada por alguns professores para lidarem com seus conflitos, seus dilemas.

No entanto, se o sofrimento pode ser tomado como um sintoma, não é o sintoma o que importa focar, mas o seu significado, ou seja, aquilo que, com ele, o sujeito está dizendo. O que é que não se comunica com palavras mas se imobiliza num sintoma? (Mannoni, 1980).

Françoise Dolto (1980) nos lembra: "o que importa não são os sintomas (...), mas o que significa, para aquele que vive, exprimindo tal ou qual comportamento, o sentido fundamental da sua dinâmica assim presentificada e as possibilidades de futuro que, para esse sujeito, o presente prepara, preserva ou compromete" (p. 12).

Daí, desde o primeiro momento, a importância da escuta. Escutar os professores. Deixá-los falar. Ainda que eles não se reconheçam no que falam; ainda que o sofrimento do qual se queixam padecer seja julgado como provocado por um outro, que não também eles próprios; ainda que eles não se vejam implicados na produção desse sofrimento.

Dolto (1980) ressalta que a escuta psicanalítica permite que as angústias e as demandas de ajuda "sejam substituídas pela questão pessoal e específica do sujeito que lhe fala [ao psicanalista]" (p. 12).

Se não cabe propor uma psicanálise coletiva dos professores na escola, cabe sim alertar para a necessidade que as pessoas têm de ser ao menos escutadas em seu trabalho. É preciso que um espaço de escuta seja criado na escola, para que os seus profissionais – pessoas responsáveis pela formação de outras pessoas – possam, ao serem ouvidos, ouvir a si mesmos. E com isso possam deixar falar um outro sujeito, o sujeito do desejo; do desejo que está "na origem da escolha profissional e na raiz do mal-estar que faz sintoma" (Almeida, 2000, p.48).

Parece que está fazendo falta indagar: qual é o lugar do desejo e do sujeito do desejo, na profissão docente? (Dejours & Abdoucheli, 1994).

Que o sofrimento faça, inevitavelmente, parte da vida – como o conflito psíquico, segundo Freud, é inerente à condição humana –, nem por isso a escola precisa ser um lugar de sua produção (ou de sua manutenção) numa intensidade que beira o insuportável, numa desmedida que produz adoecimento. Há que se apostar na possibilidade da escola como um lugar predominantemente de vida, de crescimento, de construção, não obstante suas contradições, seus paradoxos, suas ambiguidades.

No mínimo, concordando com Diniz (1998), é preciso que se construa um espaço de saúde na escola, para que os professores não continuem fugindo de si mesmos por meio do adoecimento.

Talvez o que os professores mais precisem, fundamentalmente, na escola, seja apenas de uma "presença humana que escute" (Dolto, 1980, p.13).

Bibliografia

ALMEIDA, Sandra (2000). Sintomas do mal-estar na educação: subjetividade e laço social. In: Anais do II Colóquio do Lugar de Vida / LEPSI, Usp. São Paulo.

CODO, Wanderley (org.) (1999). Educação: carinho e trabalho. Petrópolis, RJ, Vozes / Brasília: Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, Universidade de Brasília, Laboratório de Psicologia do Trabalho.

CODO, Wanderley e VASQUES-MENEZES, Iône (1999). O que é burnout? In: CODO, Wanderley (org.). Educação: carinho e trabalho. Petrópolis, RJ, Vozes / Brasília: Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, Universidade de Brasília, Laboratório de Psicologia do Trabalho.

DEJOURS, Christophe (1992). A loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. São Paulo, Cortez – Oboré.

DEJOURS, Christophe e ABDOUCHELI, Elisabeth (1994). Desejo ou motivação? A interrogação psicanalítica do trabalho. In: DEJOURS, Christophe, ABDOUCHELI, Elisabeth e JAYET, Christian. Psicodinâmica do trabalho: contribuições da escola Dejouriana à análise da relação prazer, sofrimento e trabalho. São Paulo, Atlas.

DINIZ, Margareth (1998). De que sofrem as mulheres-professoras? In: LOPES, Eliane Marta Teixeira Lopes (org.). A psicanálise escuta a educação. Belo Horizonte, Autêntica.

DOLTO, Françoise (1980). Prefácio. In: MANNONI, Maud. A primeira entrevista em psicanálise. Rio de janeiro, Campus.

ESTEVE, José M. (1995). Mudanças Sociais e função docente. In: NÓVOA, Antonio (org.) Profissão Professor. Lisboa, Porto Editora.

______________. (1999) O mal-estar docente: a sala de aula e a saúde dos professores. Bauru, SP, EDUSC.

FONTOURA, Maria Madalena (1992). Fico ou vou-me embora? In: NÓVOA, Antonio (org.). Vidas de professores. Lisboa, Porto Editora.

_______________(1930). O mal-estar na civilização. In: Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud: edição standard brasileira. Rio de Janeiro, Imago, 1996, v. XXI.

LAJONQUIÈRE, Leandro de (1999). Infância e ilusão (psico) pedagógica: escritos de psicanálise e educação. Petrópolis, RJ, Vozes.

MANNONI, Maud (1980). A primeira entrevista em psicanálise. Rio de janeiro, Campus.

1 Pedagoga, Mestra em Educação, Professora da Universidade da Amazônia - Unama e da Universidade do Estado do Pará - UEPA.
2 Há professores que, por indicação de perícia médica, são deslocados da atividade em sala de aula para outras atividades na escola, caracterizando o que se denomina desvio de função.

quinta-feira, maio 17, 2007

DOSSIÊ SOBRE SAÚDE DOS ALUNOS E PROFESSORES

Comentário Moisés: Tanto alunos como professores são vítimas de graves problemas de saúde na escola. A cada ano que passa o problema piora. As condições de trabalho estão sendo constantemente negligenciadas em função de uma lógica que faz da escola uma fábrica do século XIX.

Folha Online, 15/05/2007 - São Paulo SP - Como "matar" um professor - Gilberto Dimenstein

Há uma série de pesquisas que mostram o enorme estresse a que é submetido um professor, especialmente de escola pública, traduzindo-se em várias doenças, como ansiedade ou depressão. Ao perder o encanto de ensinar, ele estará, enquanto profissional, morto, esperando a aposentadoria.

Todos falam em inúmeros fatores por trás dessa "morte": classes superlotadas, falta de estrutura das escolas, pais desinteressados, alunos violentos, poucos estímulos para premiar o mérito etc. Há, porém, um fator pouquíssimo comentado, que, na minha opinião, é dos piores porque se associa ao mau desempenho nas notas e favorece comportamentos violentos.

Tenho recebido uma série de estudos que revelam a altíssima incidência, nas escolas públicas, de doenças e distúrbios psicológicos em estudantes. Falamos aqui em, no mínimo, 30% dos alunos, entre os quais alguns simplesmente não enxergam ou ouvem direito. Só a dislexia pode estar atingindo 15% deles. Temos na sala de aula um desfile de enfermos sem cuidados apropriados.

Isso significa que os governos deveriam ajudar as escolas a enfrentar problemas que não podem ser resolvidos pelo professor, da saúde à assistência social; filhos de famílias desestruturadas tendem a ter problemas em sala de aula. Exige-se, assim, um olhar mais sofisticado diante da educação.

Como esse olhar não existe e cada repartição do governo trabalha isoladamente, o professor acaba vítima de tensões que vão muito além da sala de aula. Esse é um dos fatores que explicam o enorme absenteísmo e a rápida rotatividade em escolas públicas tanto de estudantes como de professores.

Nessa "morte" do professor, a maior vítima, é claro, é o lado mais frágil, o aluno, acusado de ser culpado por não aprender. E aí quem "morre" é o aluno, que passa a não ter interesse pelo conhecimento.

PS - No site www.dimenstein.com.br há mais dados sobre educação e saúde.

folha de s.paulo - 14/05/2007

O massacre dos inocentes - folha de s.paulo - 14/05/2007

Deveríamos olhar com mais atenção para doenças que podem produzir marginais e alunos incapazes de aprender

Se seu filho ou aluno é esperto, mas tem muita dificuldade de aprender, preste atenção a estas estatísticas de associações psiquiátricas: entre 5% e 17% dos brasileiros sofrem de dislexia, perturbação na aprendizagem da leitura que leva a pessoa a embaralhar letras e números; pelo menos 7% têm, em algum nível, distúrbio de atenção e hiperatividade.

Essas porcentagens se traduzem em crianças e adolescentes abatidos em sua auto-estima, marginalizados, chamados de "burros" por pais e professores. Ou, pior, transformados em assassinos, traficantes ou assaltantes. Investigações em várias partes do mundo detectam alta incidência de presos com histórico de distúrbios neurológicos que dificultam a aprendizagem. Em Londres, estima-se que 50% da população carcerária sofra ou tenha sofrido desses distúrbios.

O psiquiatra Arnaldo de Castro Palma entrevistou detentos de Curitiba e concluiu que 65% deles apresentavam doenças associadas à dificuldade de aprender. Neste momento, o Instituto de Psiquiatria da USP está avaliando 5.000 internos da Fundação da Casa (antiga Febem). A julgar pelas informações preliminares, os pesquisadores encontrarão resultados preocupantes. Isso significa que essas doenças levam ao crime?

Obviamente, não. Se fosse assim, homens como Walt Disney, Einstein, Thomas Edison, Steven Spielberg, Louis Pasteur, apresentados em livros e congressos médicos como portadores de distúrbio de atenção, teriam sido improdutivos. Já que o país está cada vez mais preocupado com os estarrecedores indicadores de violência e de educação, deveríamos olhar com mais atenção para doenças que podem produzir marginais e alunos incapazes de aprender.

Suponhamos que os problemas psicológicos, incluindo não só os distúrbios de atenção, a hiperatividade e a dislexia mas também a depressão e a ansiedade, atinjam 20% dos estudantes. Qualquer psiquiatra diria que eu estou sendo demasiadamente otimista, mas deixemos assim.

Suponhamos também que, como indicam muitas pesquisas científicas, 30% deles tenham verminoses, asma crônica, rinite alérgica, anemia por falta de ferro, deficiências visuais e olfativas. Mais uma vez, estou sendo otimista na porcentagem.

Só os problemas respiratórios, como a asma, atingem mais de 15% dessa população. Na melhor das hipóteses, temos o seguinte: para cada dez estudantes, três terão dificuldades de aprender por causa não do professor ou da qualidade de ensino, mas de uma deficiência física ou psicológica.

Os filhos de famílias mais ricas, quando apresentam problemas de aprendizado, recebem tratamento médico e psicológico, além de aulas de reforço com professores particulares. Em geral, os colégios de elite são compreensivos e os ajudam a prosperar, entendendo o seu ritmo; os estudantes que, ainda assim, não conseguem acompanhar o ritmo das aulas mudam de escola antes da repetência. Em sua maioria, eles amadurecem, descobrem um talento e, graças a todo esse apoio, aprendem a se virar sozinhos.

Já os mais pobres vão se degradando nas suas doenças e entram num círculo vicioso: não conseguem reter a informação, são desprezados, perdem a autoconfiança e passam a acreditar que são mesmo "burros". Estudam em salas superlotadas, com professores desmotivados, que desenvolvem um currículo sem a menor conexão com o cotidiano. São poucas horas de aula, sem direito a reforço. A terapia encontrada para ajudá-los é fazê-los repetir o ano; pais e professores das crianças se unem para dar uma "lição" aos vagabundos.

Maria Mônica Bianchini, uma das pesquisadoras do Instituto de Psiquiatria da USP na Fundação Casa, afirma: "A baixa auto-estima pode significar abuso de drogas e álcool". Gera-se mais um círculo vicioso -muita droga, pouca atenção. Isso não quer dizer que eles entrem necessariamente no crime, mas o fato é que recebem poucos estímulos para serem produtivos. Dependendo do lugar em que vivam e da família que tenham, o risco de delinqüência é gigantesco.

É, em poucas palavras, um massacre de inocentes. Prepara-se, assim, o campo para o surgimento dos analfabetos funcionais ou dos criminosos -ou das duas coisas juntas. A pesquisa do psiquiatra Arnaldo de Castro Palma mostra que, em Curitiba, 80% dos presos são analfabetos funcionais, uma quantidade igual à dos que apresentam distúrbios de aprendizagem como dislexia, déficit de atenção e hiperatividade.

Não é possível, assim, confiar na consistência de nenhum, rigorosamente nenhum, projeto de melhoria de ensino e de segurança que não leve em conta as questões da saúde psicológica e física no aprendizado.

PS - Coloquei no site uma pesquisa sobre distúrbios de aprendizagem, com testes que ajudam a detectar alguns sintomas de doenças neurológicas. É mais simples do que se imagina.

pesquisa folha - 11/05/2007


Veja dados sobre distúrbios de aprendizagem

da Redação

Dislexia, hiperatividade, déficit de atenção, ansiedade, entre outros transtornos de aprendizagem, muitas vezes são a causa de grande parte da evasão escolar e marginalização de indivíduos. De acordo com a Associação Brasileira de Dislexia (ABD), o distúrbio é considerado como o de maior incidência dentro de sala de aula, atingindo de forma mais severa crianças em fase de alfabetização.

Percentual:
Dislexia: 5% a 17% da população
Hiperatividade e distúrbio de atenção: 7% dos alunos em idade escolar
Hiperatividade: 5% das crianças
Déficit de atenção: 3 a 5% das crianças

Na sala de aula:
Geralmente as crianças com algum tipo de distúrbio de aprendizagem não aprendem da maneira convencional, acarretando no abandono do ensino formal e fracasso na vida escolar. Leia mais sobre o assunto:
O fracasso dos jovens frente ao processo de leitura e escrita
A importância do professor na percepção das dificuldades escolares
Pedagogia da Hiperatividade e distúrbio de atenção

População carcerária:
”Pesquisas realizadas com a população carcerária de Londres divulgada no livro: The adult dyslexic The interventions & outcomes (O adulto disléxico – As intervenções e os resultados), dos autores David McLoughlin, Carol Leather e Patricia Stringer, comprova que 50% da mesma sofre de dislexia e acabam cometendo delitos por ter sua auto-estima baixa, advindo de uma sociabilidade prejudicada, expectativas frustradas e por se submeterem apenas às atividades secundárias. Seja no Brasil ou em Londres o quadro educacional parece ser o mesmo, um método de ensino que lida com todos da mesma maneira, sem fazer surgir qualidades e habilidades peculiares, principalmente dos que apresentem dificuldades específicas em determinada área do aprendizado.” (fonte: ABD)

No Brasil não há um levantamento da população carcerária como um todo, já um estudo parcial realizado pelo psiquiatra Arnaldo de Castro Palma com internos da cidade de Curitiba, no ano de 2003, mostra as seguintes condições: “Quanto a escolaridade, mais de 80% são analfabetos ou analfabetos funcionais. O conjunto daqueles que conseguiram concluir o Ensino Fundamental não atinge 10% do total de entrevistados.O grau de instrução da população carcerária é seriamente comprometido pelo alto índice de portadores de transtornos cognitivos, que reduz a capacidade de assimilar e adquirir informações, armazená-las, combiná-las, classificá-las e utiliza-las oportunamente. Numa estimativa em que se leva em consideração o histórico pessoal, é possível concluir que, a maioria absoluta dos entrevistados, foi afetada desde a infância por distúrbios da atenção e da aprendizagem. É provável que exista influência desses fatores psico-pedagógicos na conduta criminosa, especialmente entre os reincidentes e violentos. O dado numérico salta aos olhos: mais de dois terços dos entrevistados têm manifestações clínicas que indicam distúrbio de atenção.” Veja o estudo na íntegra


Alguns sinais que permitem diagnosticar os distúrbios de aprendizagem:
http://www.dislexia.com.br/sintomas.htm
http://www.tdah.org.br/diag01.php

O FRACASSO DOS JOVENS FRENTE AO PROCESSO DE LEITURA E ESCRITA: suas causas, implicações e conseqüências.

Tânia Maria de Campos Freitas

Psicopedagoga Clínica

Professora Especialista em Distúrbios de Leitura e Escrita

Diretora do CPM – Centro Psicopedagógico Maranhão

Diretora Científica da ABD – Associação Brasileira de Dislexia

Dentre os distúrbios de aprendizagem, nota-se com maior freqüência e intensidade a deficiência na aquisição e desenvolvimento da Leitura e Escrita.

Em nossa prática de consultório, atendendo crianças, adolescentes, jovens adultos, bem como os próprios pais, são comuns as queixas acerca da pouca eficiência do saber ler e escrever. São comuns ainda, queixas de professores sobre estas dificuldades, ou seja quão pouco eficiente os jovens se encontram em relação à linguagem oral, quão pouco domínio eles dispõem da verbalização adequada como instrumento de comunicação e, o mesmo ocorrendo com o domínio da leitura e da escrita.

Relatos são conhecidos por todos, sobre alunos que não aprendem Matemática, História, Ciências, etc., não por serem portadores de dificuldades específicas nas referidas áreas, mas por faltarem-lhes o instrumental básico, ou seja, na leitura a possibilidade de compreensão, a capacidade para interpretar, abstrair, inferir e estabelecer relações entre os fatos contextuais e na escrita o domínio da língua (da micro à macro estrutura), a capacidade para relacionar os dados e redigi-los de forma clara e coerente, respeitando os manejos gramaticais pertinentes e básicos à redação.

A leitura e escrita são processos muito complexos e as dificuldades podem ocorrer de maneiras diversas, além disso temos a aquisição da leitura e escrita como fator fundamental e favorecedor dos conhecimentos futuros; é uma ferramenta essencial, ou mesmo a estrutura mestra onde serão alicerçadas as demais aquisições. É apoio para as relações interpessoais, para a comunicação e leitura de seu mundo interno e externo. Uma criança que não tenha solidificado realmente sua alfabetização, poderá tornar-se frustrada diante da educação formal, terá deficitário todo seu processo evolutivo de aprendizagem, apresentará baixo rendimento escolar e pouco a pouco sua auto estima estará minada, podendo manifestar ações reativas de comportamento anti-social, bem como levá-la ao desinteresse e muitas vezes até a evasão escolar. O problema pode ainda decorrer em outros secundários que acabarão se tornando tão ou mais graves daqueles originais que produziram a ineficiência da alfabetização.

Diante deste fato, objeto de queixas de educadores, pais e profissionais ligados à área, torna-se difícil distinguir onde se encontra a falha, seja de ordem da dinâmica individual, seja de ordem do meio, ou seja devido à síndrome psicossocial, onde estão envolvidas as três vertentes ao mesmo tempo: o indivíduo, a escola e a comunidade.

A fronteira determinante destes aspectos é frágil e tênue, muito se tem discutido e pesquisado, todavia são apontadas poucas conclusões efetivas e

menor parece ser a possibilidade para ações preventivas a todas as implicações do universo da aprendizagem.

Iniciando pela análise da dinâmica do indivíduo, este terá sucesso na aquisição da leitura e escrita dependendo da evolução maturativa e equilibrada dos aspectos fisiológico, emocional, intelectual e social.

Consideramos um indivíduo realmente alfabetizado não apenas quando mecanicamente decodificar sons e letras ou seja, quando puder transpor os sons para as letras (ao escrever) e das letras para os sons (ao ler), mas de forma efetiva, ou seja quando tiver automatizado o processo, sem precisar recorrer a todo instante aos passos necessários a esta atividade; e sobretudo quando puder utilizar-se desta habilidade para obter outros conhecimentos; para assimilar e montar esquemas internos que o permitam transformar os elementos brutos da realidade e que possa operacionalizar o processo contínuo de sua própria alfabetização (já que ela não é um fim em si mesma), e da aprendizagem enquanto um todo. Ajuriaguerra aponta que enquanto este processo permanece no limiar do voluntário, seu desenvolvimento é irregular e forçado; quando se automatiza, a leitura e a escrita se tornam fáceis, livres e muito rápidas.

A aquisição deste processo todavia, depende da oralidade, da aprendizagem da fala, que na criança parece evoluir a partir da compreensão da linguagem ( linguagem interna) para a efetiva expressão da mesma (fala). Chomski coloca que não basta: “Penso, logo existo”, mas “Falo, logo penso, logo existo!”.

Para desenvolver os estágios superiores da linguagem: a compreensão da palavra impressa (a leitura) e a expressão da palavra impressa (a escrita), a criança precisa (além de ter sedimentado de forma harmoniosa as etapas da oralidade), ser capaz de articular todos os sons da língua, o que normalmente se determina aos seis anos (observadas as diferenças maturacionais de cada indivíduo). Requer ainda a ampliação e domínio do universo vocabular. Outra etapa necessária que precisa ser vencida é a capacitação para analisar as palavras em seus segmentos subsilábicos, isto é analisar os sons, que as compõem. Esta possibilidade é a chamada consciência linguística ou fonológica. Sabemos que até os seis anos, observando sempre as características individuais, a criança só consegue segmentar palavras em sílabas, a partir desta idade passa a poder segmentá-las nas unidades mínimas: as vogais e consoantes.; quando essa habilidade ocorrer podemos afirmar que a criança passa a ter uma consciência metalingüística da mesma, a consciência fonológica, que a permite analisá-la mais eficientemente.

Ainda analisando sob o viés do indivíduo, temos como outro aspecto importante para garantir este processo, que a criança tenha um nível suficiente de habilidades específicas como: o desenvolvimento da Motricidade Geral, da Integração Sensório-motora (esquema corporal, lateralidade, sentido de direção, conceito de direita e esquerda, ritmo, orientação espaço-temporal), das Habilidades Perceptivo-motoras (visão, audição, memória,...). Estas capacidades precisam ser estimuladas, já que contribuem para a viabilização do processo da leitura e escrita, ou impõem-se como impedimento para a aquisição do mesmo.

O atraso específico na leitura pode ser de natureza de déficit cognitivo, especificamente na esfera da capacidade verbal. A. F. Jorm, em “Psicologia das Dificuldades em Leitura e Ortografia”, postula que um componente particular parece estar associado com dificuldades de leitura, é a capacidade de lidar com informações fonológicas na memória.

Outro aspecto que merece ser analisado refere-se à compreensão do texto. Sabe-se que há uma estreita relação entre a capacidade da leitura mecânica e a possibilidade de compreensão, assim sendo a criança que apresenta pouca eficiência na leitura, conseqüentemente apresentará dificuldades severas na compreensão do que lê. Por outro lado há indivíduos que mesmo não apresentando deficiência na identificação das palavras, ou seja, mesmo podendo traduzir literalmente as idéias propostas no texto, manifestam dificuldades para compreendê-lo, para estabelecer uma análise inferencial e crítica. São os leitores com déficits específicos de compreensão, encontrados não somente no Ensino Fundamental e Médio, mas também e principalmente nos cursos Universitários e em adultos já formados.

Sobre os aspectos mais relativos à escrita, temos que, assim como na aquisição da fala a linguagem receptiva antecede a expressiva, no sistema visual a leitura antecede a escrita. Desta feita, a maior parte dos distúrbios da expressão da palavra impressa, a escrita, são decorrentes da ineficiência da leitura, todavia há indivíduos que mesmo sendo bons leitores apresentam distúrbios na expressão escrita. Devemos estabelecer as diferentes situações-problemas que podem ocorrer na escrita, o primeiro grupo seria composto pelas crianças e jovens, que apresentam deficiências na discriminação e associação fonema/grafema, ou seja, aqueles que não sistematizaram efetivamente o processo da escrita mecânica, como seria esperado pela sua faixa etária e acadêmica, tendo tido escolaridade favorecedora e recursos cognitivos adequados. Esse grupo apresentará deficiências na aquisição da linguagem escrita, decorrendo em falhas ortográficas como trocas por confusões visuais e/ou auditivas, omissões e acréscimos (de letras ou sílabas), poderá ainda apresentar fragmentações e junções de palavras.

O segundo grupo caracterizaria os jovens que dominam o código do grafar, todavia apresentam dificuldades para compor um texto, para expressarem-se no papel. São aqueles que não conseguem transmitir para a escrita sua ideação ou seus conhecimentos adquiridos através de suas vivências e interações no meio. São indivíduos que na oralidade denotam e expressam criatividade, expressam ainda um mundo imaginário explorado e desenvolvido, assim como manifestam domínio do conteúdo informativo e conseguem estabelecer correlações adequadamente, todavia expressam total incapacidade para lidar com as estruturas necessárias para escrever.

Essas dificuldades não sendo trabalhadas, acarretarão vivências frustrantes e limitadoras no processo geral evolutivo da aprendizagem, isto é, a criança ou o jovem que não encontram suporte e continência para sua notação gráfica deficiente, desestimulam-se frente aos fracassos que vivenciam, levando-os ao desinteresse, à impotência na forma de expressarem-se e comunicarem-se por escrito. Eles fatalmente passam a escrever cada vez menos, limitando seu imaginário e potencialidade criativas, temendo as punições que sofrerão frente aos seus erros ortográficos.

Outro fator que causa fracasso neste processo seriam as crianças portadoras da Dislexia Evolutiva, que significa, segundo Galaburda e Aboitz, uma condição clínica, caracterizada pela dificuldade na aprendizagem da leitura e escrita nos indivíduos de inteligência e estado psiquiátrico normais, que têm tido boas oportunidades de educação e oportunidades sócio-culturais adequadas., havendo correlação neurológica subjacente e que manisfestam muitos dos sintomas e das deficiências aqui descritos.

Em relação às demais atividades psíquicas envolvidas diretamente com este processo, temos por exemplo, a forma como a criança organiza seu pensamento, as suas características de personalidade, o como ela investe afetivamente no meio e, principalmente qual a função que a linguagem representa enquanto veio de comunicação.

A psicanálise através de Freud, coloca o quanto os aspectos inconscientes influenciam a aprendizagem e o quanto nossa harmonia psíquica capacita ou prejudica esta atividade. Se a nossa psique é o veio através do qual se dá nossa relação com o mundo, e, se é através dela que tomamos contato com o meio e o introjetamos, estando este aparelho como o chama Bion, em confusão ou conflitado em termos emocionais, terá alterada e prejudicada esta interiorização. Se uma criança, por exemplo, não teve em princípio um bom vínculo com a mãe, ou sua substituta, poderá desenvolver relações desfavoráveis em seu processo geral de aprendizagem e especificamente com a aquisição da linguagem oral, da leitura e escrita, podendo ser esta a sua forma de expressão de sintomas reativos manifestos. A linguagem, neste caso, poderá estar cumprindo uma função de alerta de que a comunicação, entre ela (a criança) e o mundo, está prejudicada.

Entendemos que além das possibilidades lingüísticas, perceptivas, motoras e cognitivas, além dos métodos, dos recursos didáticos, aprender implica em um sujeito que busca a aquisição do conhecimento, e significa sempre uma experiência emocional. Assim sendo, um indivíduo que não tenha motivação , não se estimulará para a aquisição de habilidades tão complexas que exigirão, capacidade para frustração adequada, possibilidade para seguir os padrões fixos e sistemáticos que o processo da leitura e escrita requer.

Dos aspectos relativos à dinâmica do meio, podemos apontar a falta de escolarização ou à privação cultural adequadas do meio, à própria marginalização do sujeito com dificuldades pelo ensino comum, sofrendo este a pecha de incompetente e desajustado, desfocando a responsabilidade da “Instituição- escola” para o indivíduo, a superlotação das salas de aula, que impedem a individuação dos alunos. Outros fatores relativos ao meio interferem na qualidade da aquisição da leitura e escrita, tais como a inadequação de métodos específicos às particularidades dos educandos, a escolha da metodologia baseada nas diferentes necessidades e dificuldades que os indivíduos apresentam, a aplicação de currículos sem fundamentação teórica, não sendo respeitados os reais níveis etários e possibilidades instrumentais dos alunos, o que acarreta em exigências aquém ou além da competência dos alunos. A pouca ou ineficiente estimulação dos professores, ou mesmo as relações educador/educando estabelecidas de forma conflitada, a inabilidade dos educadores para observar e detectar as reais deficiências manifestadas pelos seus alunos, o que impede a possibilidade de diagnóstico e tratamentos precoces e preventivos.

Em relação à família observam-se as altas ou baixas expectativas que são projetadas nos filhos, muitas vezes por desconhecimento da capacidade dos mesmos, ou ainda por projeções baseadas inconscientemente em suas próprias experiências escolares, causando-lhes vivências impotentes e baixa estima, quando não conseguem corresponder. É bastante comum referências de pais sobre similaridades de história de fracassos na leitura e escrita, suas e de seus filhos, estabelecendo desta forma uma identificação de modelos atávicos.

Finalizando, podemos concluir a relevância primordial de se ter o conhecimento do sujeito em seu processo evolutivo de aprendizagem, e sobretudo focar a atenção em sua unidade, observando os aspectos individuais (sejam eles cognitivos ou afetivo-emocionais), os familiares e os da comunidade como um todo, já que esse todo compõe o universo de cada um. Importante ainda ressaltar que educadores por vezes, iniciam precocemente o processo de aquisição da leitura e escrita, sem dar a devida estimulação às habilidades, o que acarretará em prejuízo à aquisição. Além disso, se estas habilidades cognitivas apresentam-se deficitárias, o estarão, antes mesmo da criança iniciar o processo de alfabetização, assim sendo, uma avaliação precoce possibilitará o diagnóstico e o tratamento e desta forma teremos uma alternativa de prevenção para evitar futuros transtornos acumulativos que decorrerão dessas deficiências já constatadas. A observação e o encaminhamento da criança pelo educador atento, favorece ainda o planejamento de métodos adequados e específicos para a aquisição da leitura e escrita das crianças com suas características próprias, além de possibilitar indicações de escolas que possam ser continentes a essas crianças e orientação familiar.

A importância do professor na percepção das dificuldades escolares

Nos últimos anos, muito têm acontecido na educação do Brasil.Surgiram programas para erradicação da alfabetização, partindo de ONGs e governos. Foram construídos centros de apoio à atividades extras escolares, que atendem em período integral, mas, ainda falta algo de concreto e que comece por um processo de mudança, já que se verificarmos dados, temos entre analfabetos funcionais (que escrevem seus nomes, lêem frases, mas geralmente não conseguem interpretá-las ou redigir um texto) e analfabetos, 75% da população Brasileira. Lamentável! Pode-se atribuir esse número à exclusão educacional por falta de escolas, ou escolas super lotadas e em péssimas condições, professores mal formados e, conseqüentemente, despreparados para atuarem. Porém, há uma questão pouco comentada no Brasil, até por que a educação não é o assunto de principal interesse a ser debatido entre nossos governantes e meios de comunicação, os distúrbios de aprendizagem, dentre eles, a dislexia, uma disfunção neurológica que atinge de 10 a 15% da população mundial.

Os objetivos, conteúdos, metodologias, organização, funcionamento e avaliação adotados pelas escolas nada têm a ver com os disléxicos. Eles têm como principais dificuldades em sala de aula a linguagem e a escrita, a ortografia, a lentidão na aprendizagem da leitura, a disgrafia (letra feia); em decorar seqüências, como meses do ano, alfabeto e tabuada; troca de letras na escrita e ainda desatenção e dispersão, geralmente não conseguindo copiar trechos de livros e textos de lousas. Estas pessoas não aprendem da maneira convencional acarretando no abandono do ensino formal, pelos fracassos na vida escolar, que culminam em complicações psicológicas.

Portanto, os professores e educadores em geral precisam estar sensíveis às demandas sociais, culturais e econômicas, que circundam seus alunos e, principalmente, as comportamentais. Por essa rotina contemporânea, totalmente sem ter horários definidos, mergulhados em compromissos e obrigações, geralmente os professores ficam mais tempo com os alunos do que os próprios pais, ou seja, eles terão a incumbência de estar atento às dificuldades e anseios apresentados por estas crianças. Porém, não é o que acontece na maioria dos casos.

Membros da Associação Brasileira de Dislexia -ABD vêm desenvolvendo um trabalho que visa justamente ir de encontro a essa mudança, com leis e diretrizes governamentais, que amplie o amparo aos portadores de distúrbios de aprendizagem e dislexia, muitos destes, hoje desamparados, taxados de maneira errônea pelo pouco conhecimento de professores e educadores, que por falta de investimentos na área, nada podem fazer senão apenas seguir o modelo de ensino vigente da educação brasileira.

Para mais informações:

Associação Brasileira de Dislexia – ABD.

Marcio Zonta – Assessoria de Imprensa
www.dislexia.org.br / comunica@dislexia.org.br

11- 3258-7568 / 11- 3237-0809

2005-06-30 - Pedagogia da Hiperatividade e distúrbio de atenção

Os dados percentuais de crianças e adolescentes que apresentam hiperatividade e distúrbios de atenção no Brasil ainda são muito vagos. No entanto acredita-se que, pelo menos 7% dos alunos em idade escolar apresentam sintomas que, associados, moldam o quadro desse transtorno.
Aqueles alunos que os professores classificam como “pestinhas” são os mais propensos a desenvolver o distúrbio que é caracterizado por:

• Dificuldades em manter a atenção,
• Dificuldades em seguir ordens,
• Dificuldades para ficar quieto, sentado e trabalhar de forma independente na sala de aula;(entre outros sintomas)

O comportamento inadequado por esses alunos frequentemente interrompe a concentração de seus colegas e geralmente resulta em relações pobres com os demais alunos. Adicionalmente, esses problemas geralmente são acompanhados por outros associados (por exemplo, baixa auto-estima, depressão ) que pode afetar significativamente a performance desses estudantes.
Para lidar com esses alunos de forma eficiente e contribuir com a melhoria da sua condição, levantamos alguma dicas básicas que podem ser usadas em sala de aula:

• Olhe sempre nos olhos;
• Usar recursos e formas de apresentação não habituais - crianças com distúrbio de atenção adoram novidades;
• A memória é um grave problema para eles - Ensine mnemônicos, quadrinhas, dicas, rimas;
• Divida as grandes tarefas em tarefas menores - Isso possibilita 'a criança a vislumbrar que a tarefa PODE ser terminada;
• Elogiar o aluno com constância - NÃO APENAS QUANDO ELE TERMINA A TAREFA, mas DURANTE o transcorrer da mesma, INCENTIVANDO o seu término;
• Utilizar metodologia preferencialmente visual, uma vez que os alunos com esse distúrbio aprendem melhor dessa maneira.

Se algum de seus alunos apresentar sintomas, você pode se informar melhor no site www.tdah.org.br.

Alguns sinais que permitem diagnosticar os distúrbios de aprendizagem:

DISLEXIA: SINTOMAS E SINAIS

Na Primeira Infância:

1 - atraso no desenvolvimento motor desde a fase do engatinhar, sentar e andar;
2 - atraso ou deficiência na aquisição da fala, desde o balbucio á pronúncia de palavras;
3 - parece difícil para essa criança entender o que está ouvindo;
4 - distúrbios do sono;
5 - enurese noturna;
6 - suscetibilidade à alergias e à infecções;
7 - tendência à hiper ou a hipo-atividade motora;
8 - chora muito e parece inquieta ou agitada com muita freqüência;
9 - dificuldades para aprender a andar de triciclo;
10 - dificuldades de adaptação nos primeiros anos escolares.

Observação:

Pesquisas científicas neurobiológicas recentes concluiram que o sintoma mais conclusivo acerca do risco de dislexia em uma criança, pequena ou mais velha, é o atraso na aquisição da fala e sua deficiente percepção fonética. Quando este sintoma está associado a outros casos familiares de dificuldades de aprendizado - dislexia é, comprovadamente, genética, afirmam especialistas que essa criança pode vir a ser avaliada já a partir de cinco anos e meio, idade ideal para o início de um programa remediativo, que pode trazer as respostas mais favoráveis para superar ou minimizar essa dificuldade.

A dificuldade de discriminação fonológica leva a criança a pronunciar as palavras de maneira errada. Essa falta de consciência fonética, decorrente da percepção imprecisa dos sons básicos que compõem as palavras, acontece, já, a partir do som da letra e da sílaba. Essas crianças podem expressar um alto nível de inteligência, "entendendo tudo o que ouvem", como costumam observar suas mães, porque têm uma excelente memória auditiva. Portanto, sua dificuldade fonológica não se refere à identificação do significado de discriminação sonora da palavra inteira, mas da percepção das partes sonoras diferenciais de que a palavra é composta. Esta a razão porque o disléxico apresenta dificuldades significativas em leitura, que leva a tornar-se, até, extremamente difícil sua soletração de sílabas e palavras. Por isto, sua tendência é ler a palavra inteira, encontrando dificuldades de soletração sempre que se defronta com uma palavra nova.

Porque, freqüentemente, essas crianças apresentam mais dificuldades na conquista de
domínio do equilíbrio de seu corpo com relação à gravidade, é comum que pais possam submete-las a exercícios nos chamados "andadores" ou "voadores". Prática que, advertem os especialistas, além de trazer graves riscos de acidentes, é absolutamente inadequada para a aquisição de equilíbrio e desenvolvimento de sua capacidade de andar, como interfere, negativamente, na cooperação harmônica entre áreas motoras dos hemisférios esquerdo-direito do cérebro. Por isto, crianças que exercitam a marcha em "andador", só adquirem o domínio de andar sozinhas, sem apoio, mais tardiamente do que as outras crianças.
Além disso, o uso do andador como exercício para conquista da marcha ou visando uma maior desenvoltura no andar dessa criança, também contribui, de maneira comprovadamente negativa, em seu desenvolvimento psicomotor potencial-global, em seu processo natural e harmônico de maturação e colaboração de lateralidade hemisférica-cerebral.

A Partir dos Sete Anos de Idade:

1 - pode ser extremamente lento ao fazer seus deveres:
2 - ao contrário, seus deveres podem ser feitos rapidamente e com muitos erros;
3 - copia com letra bonita, mas tem pobre compreensão do texto ou não lê o que escreve;
4 - a fluência em leitura é inadequada para a idade;
5 - inventa, acrescenta ou omite palavras ao ler e ao escrever;
6 - só faz leitura silenciosa;
7 - ao contrário, só entende o que lê, quando lê em voz alta para poder ouvir o som da palavra;
8 - sua letra pode ser mal grafada e, até, ininteligível; pode borrar ou ligar as palavras entre si;
9 - pode omitir, acrescentar, trocar ou inverter a ordem e direção de letras e sílabas;
10 - esquece aquilo que aprendera muito bem, em poucas horas, dias ou semanas;
11 - é mais fácil, ou só é capaz de bem transmitir o que sabe através de exames orais;
12 - ao contrário, pode ser mais fácil escrever o que sabe do que falar aquilo que sabe;
13 - tem grande imaginação e criatividade;
14 - desliga-se facilmente, entrando "no mundo da lua";
15 - tem dor de barriga na hora de ir para a escola e pode ter febre alta em dias de prova;
16 - porque se liga em tudo, não consegue concentrar a atenção em um só estímulo;
17 - baixa auto-imagem e auto-estima; não gosta de ir para a escola;
18 - esquiva-se de ler, especialmente em voz alta;
19 - perde-se facilmente no espaço e no tempo; sempre perde e esquece seus pertences;
20 - tem mudanças bruscas de humor;
21 - é impulsivo e interrompe os demais para falar;
22 - não consegue falar se outra pessoa estiver falando ao mesmo tempo em que ele fala;
23 - é muito tímido e desligado; sob pressão, pode falar o oposto do que desejaria;
24 - tem dificuldades visuais, embora um exame não revele problemas com seus olhos;
25 - embora alguns sejam atletas, outros mal conseguem chutar, jogar ou apanhar uma bola;
26 - confunde direita-esquerda, em cima-em baixo; na frente-atrás;
27 - é comum apresentar lateralidade cruzada; muitos são canhestros e outros ambidestros;
28 - dificuldade para ler as horas, para seqüências como dia, mês e estação do ano;
29 - dificuldade em aritmética básica e/ou em matemática mais avançada;
30 - depende do uso dos dedos para contar, de truques e objetos para calcular;
31 - sabe contar, mas tem dificuldades em contar objetos e lidar com dinheiro;
32 - é capaz de cálculos aritméticos, mas não resolve problemas matemáticos ou algébricos;
33 - embora resolva cálculo algébrico mentalmente, não elabora cálculo aritmético;
34 - tem excelente memória de longo prazo, lembrando experiências, filmes, lugares e faces;
35 - boa memória longa, mas pobre memória imediata, curta e de médio prazo;
36 - pode ter pobre memória visual, mas excelente memória e acuidade auditivas;
37 - pensa através de imagem e sentimento, não com o som de palavras;
38 - é extremamente desordenado, seus cadernos e livros são borrados e amassados;
39 - não tem atraso e dificuldades suficientes para que seja percebido e ajudado na escola;
40 - pode estar sempre brincando, tentando ser aceito nem que seja como "palhaço" ;
41 - frustra-se facilmente com a escola, com a leitura, com a matemática, com a escrita;
42 - tem pré-disposição à alergias e à doenças infecciosas;
43 - tolerância muito alta ou muito baixa à dor;
44 - forte senso de justiça;
45 - muito sensível e emocional, busca sempre a perfeição que lhe é difícil atingir;
46 - dificuldades para andar de bicicleta, para abotoar, para amarrar o cordão dos sapatos;
47 - manter o equilíbrio e exercícios físicos são extremamente difíceis para muitos disléxicos;
48 - com muito barulho, o disléxico se sente confuso, desliga e age como se estivesse distraído;
49 - sua escrita pode ser extremamente lenta, laboriosa, ilegível, sem domínio do espaço na página;
50 - cerca de 80% dos disléxicos têm dificuldades em soletração e em leitura.

Crianças disléxicas apresentam combinações de sintomas, em intensidade de níveis que variam entre o sutil ao severo, de modo absolutamente pessoal. Em algumas delas há um número maior de sintomas e sinais; em outras, são observadas somente algumas características. Quando sinais só aparecem enquanto a criança é pequena, ou se alguns desses sintomas somente se mostram algumas vezes, isto não significa que possam estar associados à Dislexia. Inclusive, há crianças que só conquistam uma maturação neurológica mais lentamente e que, por isto, somente têm um quadro mais satisfatório de evolução, também em seu processo pessoal de aprendizado, mais tardiamente do que a média de crianças de sua idade.

Pesquisadores têm enfatizado que a dificuldade de soletração tem-se evidenciado como um sintoma muito forte da Dislexia. Há o resultado de um trabalho recente, publicado no jornal Biological Psychiatry e referido no The Associated Press em 15/7/02, onde foram estudadas as dificuldades de disléxicos em idade entre 7 e 18 anos, que reafirma uma outra conclusão de pesquisa realizada com disléxicos adultos em 1998, constando do seguinte:
que quanto melhor uma criança seja capaz de ler, melhor ativação ela mostra em uma específica área cerebral, quando envolvida em exercício de soletração de palavras. Esses pesquisadores usaram a técnica de Imagem Funcional de Ressonância Magnética, que revela como diferentes áreas cerebrais são estimuladas durante atividades específicas. Esta descoberta enfatiza que essa região cerebral é a chave para a habilidade de leitura, conforme sugerem esses estudos.

Essa área, atrás do ouvido esquerdo, é chamada região ocipto-temporal esquerda. Cientistas que, agora, estão tentando definir que circuitos estão envolvidos e o que ocorre de errado em Dislexia, advertem que essa tecnologia não pode ser usada para diagnosticar Dislexia.

Esses pesquisadores ainda esclarecem que crianças disléxicas mais velhas mostram mais atividade em uma diferente região cerebral do que os disléxicos mais novos. O que sugere que essa outra área assumiu esse comando cerebral de modo compensatório, possibilitando que essas crianças conseguiam ler, porém somente com o exercício de um grande esforço.